Investimentos
Curitiba se mantém na contramão
Apesar da movimentação em torno da causa dos ciclistas, o poder público parece não se comover com o avanço das bicicletas.
Segundo dados do site Curitiba Aberta, um portal de transparência mantido pela prefeitura, a cidade não investiu neste ano sequer um real na rede de ciclovias da cidade, apesar de o orçamento deste ano destinar R$ 2 milhões para "implantação e revitalização da infraestrutura cicloviária do município".
No ano passado, também não houve investimentos. O orçamento de 2010 previa R$ 2,27 milhões para as ciclovias. Uma revisão orçamentária reduziu a quantia para R$ 26 mil, um corte de 99,6%. Mesmo assim, o valor empenhado durante o ano todo foi igual a zero. Já para os gastos com divulgações das ações de governo, a prefeitura gastou, em média, R$ 2,75 milhões por mês, mais do que todo o orçamento anual previsto para criar uma infraestrutura para as bicicletas.
Direto das ciclofaixas de Berlim
O país que criou ícones do mundo automotivo como BMW, Mercedes-Benz, Audi e Volkswagen e que viu nascer o heptacampeão mundial de Fórmula-1 Michael Schumacher e o jovem talento Sebastian Vettel teria tudo para ser o "inimigo nº 1" das bikes. Mas, na Alemanha, bicicleta é usada como meio de transporte e respeitada por motoristas e pelo poder público.
Política segue na rede e em canções de protesto
A ONG Voto Livre fez da bicicleta o veículo para incentivar a população a participar da vida política da cidade. Formada por representantes da sociedade civil local, a entidade trabalha para apresentar um projeto de iniciativa popular na Câmara dos Vereadores de Curitiba que inclua a bicicleta como modal de transporte na cidade. A proposta prevê a destinação de 5% da malha viária local para a construção de ciclovias e ciclofaixas no modelo funcional hoje as ciclovias da cidade são voltadas exclusivamente ao lazer.
A bicicleta deixou de ser apenas um meio de transporte: em Curitiba, ela se tornou ícone de uma causa coletiva. A despeito da falta de infraestrutura urbana ? como ciclovias e ciclofaixas ? e do ambiente hostil para quem pedala no trânsito da capital mais motorizada do país, a cidade vê o veículo de duas rodas se transformar em uma bandeira política, em torno da qual militam, lado a lado, ?mauricinhos? e anarquistas, patrões e empregados, motoristas e pedestres.
VÍDEO: Veja como é o cotidiano das bicicletas em Berlim, na Alemanha
A causa da bicicleta, defendida de forma isolada por diversos grupos organizados, vem se estruturando e ganhando força. O movimento já encontra representantes no meio cultural e artístico local, tem o apoio incondicional de ambientalistas e organiza encontros semanais e mensais. Além disso, estimulada por ONGs, a bicicleta virou instrumento para promover o exercício da cidadania e conta com a militância de pessoas comuns, que optaram pelo veículo movido a energia humana ? ou, como preferem, ?movido a arroz e feijão.?
No último sábado de cada mês, Curitiba se integra a mais 200 cidades em todo o mundo que organizam as chamadas ?Bicicletadas?. O movimento, nascido na Espanha com o nome de Massa Crítica, tem como objetivo estimular o uso da bicicleta como veículo de transporte sustentável nas grandes cidades.
?Ganhando um porcentual cada vez maior de adeptos, teremos uma cidade mais silenciosa, menos poluída e com mais gente nas ruas. O pedestre e o ciclista vivem em outra cidade, que não a cidade do motorista?, defende o filósofo e ciclista Jorge Brand, que participa da Bicicletada de Curitiba. ?Toda pessoa pode se tornar ciclista desde que a cidade ofereça condições de segurança, mas, na capital, não é isso que vemos acontecer?, avalia.
Ainda assim, a cidade reúne outros grupos em torno da mesma causa. O Curitiba Cycles Chic, por exemplo, promove uma aliança entre o mundo da moda e o do pedal, pregando que é possível pedalar com estilo ? vestindo terno e gravata ou roupas de grife.
A agenda ciclística curitibana conta ainda com dois outros encontros semanais: o Pedala Curitiba, realizado pela prefeitura todas às terças-feiras e o Curitiba Bike Night, que ocorre nas noites de quinta-feira.
O ciclista Roberto Coelho conta que o grupo começou em 2000, como uma reunião de oito amigos que se encontravam após o expediente para um passeio. ?Com o tempo a coisa cresceu, começaram a aparecer os amigos dos amigos?, conta o criador do grupo.
Com o número de ciclistas aumentando, a prefeitura de Curitiba passou a apoiar as pedaladas noturnas, cedendo dois batedores da Diretran para acompanhar o grupo. Até que, há cerca de quatro anos, a Secretaria Municipal de Esporte e Lazer ?incorporou? o evento na agenda oficial do município, rebatizando-o de ?Pedala Curitiba?. Com a mudança de data do evento oficial para as terças-feiras, o grupo ?original? permaneceu se encontrando às quintas e hoje reúne cerca de 80 pessoas, pouco menos que o Pedala Curitiba, que tem média de 120 ciclistas por edição.
Ciclistas unidos
Os ciclistas curitibanos trabalham agora para reunir os diversos movimentos em torno da bicicleta em uma associação que dê força política ao movimento. A entidade, provisoriamente batizada de Associação dos Ciclistas do Alto Iguaçu, deverá ser formalmente constituída no próximo domingo (22). ?Vamos unir todos esses grupos que operam de forma dispersa. O objetivo é conseguir alavancar ganhos mais concretos para a bicicleta na cidade?, explica Goura.
Segundo ele, desde 2005, o coletivo Bicicletada Curitiba já participou de reuniões com prefeitos, vereadores, e técnicos do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), mas sem grandes avanços. ?Tudo depende da vontade política. Há alguns anos houve o anúncio da reforma na Avenida Cândido de Abreu. Pedimos para que o uso da bicicleta fosse incluído no projeto, o que não foi feito. A rede cicloviária da cidade é precária, ruim tanto para o ciclista quanto para o pedestre?, critica.
Confira o vídeo sobre as bicicletas na Alemanha:
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