O pássaro
Quase extinto no Paraná
Embora esteja no nome de duas cidades do litoral paranaense (Guaratuba e Guaraqueçaba, que significa ninho de guarás), onde costumavam aparecer aos montes, hoje os guarás estão praticamente extintos no estado. O abate das aves pelos caçadores, interessados na plumagem do animal, e a destruição dos ninhos pela procura dos ovos, fez com que, há mais de um século, a população não avistasse um exemplar em Guaratuba. Por isso, a presença deles foi tão comemorada. "Esse é o maior exemplo de que a vida natural é persistente, e que os animais lutam com todas as forças pela sobrevivência", diz o biólogo e ernitólogo Marcos Bornschein.
Segundo Bornschein, provavelmente, as aves avistadas em Guaratuba não nasceram aqui, pois não há registros de ninhos no estado. "Devem ter vindo de regiões onde eles ainda existem em grande número, como Iguape, Cubatão e Ilha Comprida, no litoral paulista." De toda forma, o fato de as aves visitarem o Paraná significa que as condições de alguns locais voltaram as ser propícias para a espécie, que se alimenta principalmente de caranguejos e prefere locais mais quentes. O ernitólogo diz que é cedo para apontar os danos causados pelo abate, mas que o incidente pode afugentá-los. "Tudo vai depender de quantos eram e de quantos ficaram. De toda forma, é uma perda grande, pois essa é uma espécie quase em extinção."
ONG japonesa pode desistir de projeto
Ao longo da última década, ONGs e a prefeitura de Guaratuba vêm trabalhando em projetos que buscam entender e explicar em que condições se deu o desaparecimento dos guarás na área e o que fazer para que eles voltem a habitá-la. As tentativas, porém, sempre esbarraram na escassez de recursos, como admite o próprio órgão municipal. A situação começou a mudar há cerca de três anos, quando os guarás voltaram a ser avistados na baía. A boa notícia chamou a atenção de uma ONG japonesa, a Associação de Avanços Ambientais de Hyogo, que se comprometeu a custear um projeto que pretende estudar o padrão de alimentação dos guarás e o quanto os bancos de alimentos encontrados nos manguezais da baía influenciam na sua presença na região. "No Japão, existe o guará branco, que acabou desaparecendo com o avanço industrial. Para o Japão, é interessante custear o estudo e entender o que ocorreu aqui para que os guarás voltassem, para que eles possam aplicar o conhecimento lá", diz o biólogo Márcio Nascimento.
Com o abate das aves, porém, a prefeitura teme que a ONG desista de bancar o estudo. "Se eles entenderem que um biólogo abateu dois guarás, e que nada aconteceu, pelo contrário, que um órgão público como o IAP aceitou a justificativa dada, eles podem cortar o investimento. E o Brasil pode perder muito com isso". O projeto já foi enviado à ONG e espera a aprovação para ser iniciado.
O guará, pássaro vistoso, de plumas cor de laranja e porte elegante, é um símbolo de Guaratuba a cidade de muitos guarás. Embora a ave faça parte do nome do município e sua imagem seja explorada em diversos pontos, a espécie estava desaparecida da cidade havia pelo menos um século. Só há registros da presença do pássaro, ameaçado de extinção por causa da caça predatória, em outros municípios o último foi em 1977, em Antonina. Por isso, o aparecimento de 12 indivíduos há três anos na Baía de Guaratuba causou comoção entre moradores e biólogos. Os guarás estavam voltando. A alegria, porém, deu lugar à apreensão.
Há algumas semanas, a Secretaria de Meio Ambiente da cidade tomou conhecimento de que um biólogo teria abatido duas aves da espécie que está na lista dos animais criticamente ameaçados de extinção dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaratuba. O abate ocorreu no dia 15 de maio e foi presenciado por um morador. O biólogo Louri Klemann Júnior foi credenciado pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) para fazer a coleta de outras duas espécies, tapicuru-de-cara-pelada e caraúna-de-cara-branca, mas abateu os pássaros ameaçados. Em ofício enviado ao IAP, Klemann admite o fato, mas afirma que o fez por engano, devido "às distâncias com que foram feitas as coletas e à luminosidade desfavorável durante a manhã daquele dia (com a presença de névoa)". Procurado pela Gazeta do Povo, o biólogo afirmou que não tinha interesse em conversar com a reportagem.
Para o zootecnista e funcionário do Departamento de Meio Ambiente da prefeitura de Guaratuba, Márcio Nascimento, a justificativa não é plausível. "Se a visibilidade é ruim e o pássaro está longe, ele não deveria abater. Na dúvida, não se atira", afirma. O Ibama, em e-mail enviado à prefeitura, ao qual a reportagem teve acesso, afirma que não tem competência para realizar autuações, já que o abate se deu em área estadual, mas ressalta que a justificativa parece "mais uma tentativa de ficar com o animal do que defesa propriamente dita" e que "a culpa está clara, uma vez que as condições de visibilidade só serão ruins porque o próprio pesquisador optou pela coleta nessas condições".
Nascimento afirma que a prefeitura pretende cobrar explicações do IAP sobre uma possível multa a ser aplicada nesse caso, pois o fato pode abrir precedentes para que outros profissionais façam o mesmo. "Não existe exemplar dessa ave em museus do Paraná, logo, coletar uma delas incrementa o currículo de qualquer profissional. E se um biólogo, vindo de fora, faz algo assim e se redime com essa justificativa, qualquer um pode alegar o mesmo." A vice-presidente do comitê gestor da APA, a bióloga Bianca Reinert, lamentou o fato e disse esperar que o IAP investigue o caso. "A espécie em questão é ameaçada de extinção no estado do Paraná e não pode ser coletada. Lamento muito o ocorrido e espero que a ave símbolo de Guaratuba não tenha abandonado o local."
Devolução
Atualmente, os dois guarás se encontram no Museu de História Natural Capão da Imbuia, em Curitiba. O museu foi a instituição que contratou o biólogo para coletar as espécies do tapicuru e do caraúna. De acordo com Nascimento, a prefeitura pretende reclamar a devolução dos guarás. "Não é justo que Guaratuba perca o exemplar para um museu de Curitiba. Eles não deveriam ser abatidos, mas como foram, devem ficar no município." A reportagem não conseguiu contatar os responsáveis pela instituição. Já o IAP, por meio da diretora de Biodiversidade e Áreas Protegidas, Márcia Tussolino, se limitou a afirmar que o biólogo não possuía licença para abater os guarás e que irá analisar o caso.
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