Na semana do dia Sete de Setembro, uma consulta popular perguntará aos brasileiros se eles querem uma lei que limite o tamanho máximo das propriedades rurais no Brasil. Por contar com o apoio de setores da Igreja Católica, a consulta chegou a ser chamada de "plebiscito da CNBB" (referência à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) pelo candidato à Presidência Plínio de Arruda Sampaio, em um debate televisivo, o que foi desmentido quinta-feira pelo presidente da entidade, dom Geraldo Lyrio Rocha. Na verdade, não só o plebiscito não é responsabilidade da CNBB como os próprios bispos estão se manifestando contra os termos da consulta e a forma como ela vem sendo conduzida.
"Isso nem é uma votação oficial, promovida pelo governo; e ainda por cima o organizador (o Fórum Nacional pela Reforma Agrária) toma partido, influenciando a campanha. Veja que ninguém defende os argumentos contrários aos da organização. Plebiscito mesmo é o que fazem lá de onde eu venho", afirma dom Cristiano Jakob Krapf, suíço de nascimento e bispo de Jequié (BA). "O que me preocupa é quererem envolver a Igreja toda nisso", acrescenta. O arcebispo de Uberaba (MG), dom Aloísio Opperman, vai mais longe. "Estão nos empurrando para uma aventura com a qual poucos concordam", afirma.
Dom Aloísio não é contrário a uma consulta popular, mas acha que esta é a hora errada. "A questão do limite ainda não está amadurecida", argumenta. Os bispos afirmam que a Assembleia-Geral da CNBB, realizada em Brasília em maio, não fechou posição sobre a questão. "Nós discutimos o assunto, mas em nenhum momento houve decisão, nem sobre o limite da terra, nem sobre o que fazer com a propriedade excedente", afirma. Dom Demétrio Valentini, bispo de Jales (SP) e favorável à consulta, admite que a CNBB não fechou posição sobre o assunto. "Mas nem tudo precisa ter aprovação oficial da assembleia. A consulta fazia parte dos gestos concretos da Campanha da Fraternidade de 2010", afirma.
Opinião livre
Dom Cristiano ressalta que não é intenção dos bispos contrários ao plebiscito promover divisão dentro da Igreja ou da CNBB. "Esse é um assunto sobre o qual todo católico é livre para ter sua opinião. Não é uma questão de fé ou de doutrina nessas, sim, é preciso haver unidade, especialmente entre os bispos", argumenta. Em Santa Catarina, houve insistência para que os bispos apoiassem o plebiscito.
"Mas não teria sentido darmos nosso apoio a um tema que nunca foi objeto de uma discussão ampla. Por uma maioria considerável, ficou decidido que as dez dioceses catarinenses não apoiarão este plebiscito. Se um dia houver uma consulta sobre a reforma agrária que tenha sido estudada, debatida e aprovada pela CNBB, nosso comportamento será outro", afirma o arcebispo de Florianópolis, dom Murilo Krieger.
Questão agrária
Os bispos também rejeitam o rótulo de "insensíveis" às questões do campo pelo fato de se posicionarem contra o plebiscito. "Hoje não temos litígio no território da arquidiocese, mas já houve invasões que se tornaram assentamentos, em que as fazendas foram desapropriadas e os proprietários, indenizados. Durante o tempo de indefinição, demos atenção especial aos sem-terra, fizemos campanhas de arrecadação. Hoje o assentamento tem capela e atendimento pastoral", diz dom Aloísio, de Uberaba.
Dom Murilo explica que a doutrina da Igreja sobre a questão agrária pode ser encontrada especialmente no documento Para uma melhor distribuição da terra o desafio da Reforma Agrária, do Pontifício Conselho Justiça e Paz. "A Igreja reconhece o direito à propriedade, mas condena a apropriação indevida e a concentração de terra", diz o arcebispo de Florianópolis. Dom Aloísio também lembra que as invasões de terra foram repetidamente condenadas por João Paulo II.
A organização do plebiscito sugere o uso de paróquias para a votação, mas a permissão depende de cada bispo. "Quem quiser se engajar neste plebiscito pode fazê-lo com liberdade, mas não usaremos nossas estruturas eclesiais para divulgá-lo ou para favorecer a coleta de assinaturas", afirma dom Murilo. O padre Dirceu Fumagalli, coordenador nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), minimiza a proibição. "Se não deixarem fazer dentro da Igreja não tem problema, fazemos na praça mesmo", contesta.