Rio de Janeiro – Ostentando o título de quinto país mais desigual do mundo, o Brasil vive intensamente o debate sobre quais as melhores políticas sociais para melhorar a posição do país nessa estatística. O ganho de escala do Bolsa-Família, que distribui a 11 milhões de famílias renda de até R$ 95 mensais ou o aumento real do salário mínimo? O que é mais eficaz contra a pobreza e a desigualdade?

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De um lado, a favor do aperfeiçoamento do Bolsa-Família, sua maior abrangência e aumento do valor do benefício estão Ricardo Paes e Barros e Lauro Ramos, ambos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas. Na defesa da valorização do salário mínimo, que teve reajuste real próximo de 20% nos dois últimos anos, estão os economistas Cláudio Dedecca, da Unicamp e o diretor do Instituto de Economia da UFRJ, João Sabóia. Márcio Pochmann, professor da Unicamp, acredita que as duas políticas são complementares e atingem populações diferentes.

Ricardo Paes e Barros considerou reajuste real de 10% no mínimo para fazer as comparações. Com o reajuste, os trabalhadores com ou sem carteira, servidores, aposentados e pensionistas que ganham próximo de um mínimo receberiam R$ 5,8 bilhões a mais, desses, R$ 1,6 bilhão chegaria às mãos dos pobres, alcançando 27% das famílias com renda domiciliar per capita até R$ 162.

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"Se aumentarmos o benefício do Bolsa-Família em 50%, o gasto total seria de R$ 2,3 bilhões, mas atingiria 70% das famílias pobres. Não há dúvida sobre qual política é mais eficiente. O salário mínimo reduz um pouco a pobreza e a desigualdade, mas por vias secundárias", diz.

Pelas suas contas, na desigualdade o efeito é semelhante. Como o mesmo reajuste de 10% no mínimo, o Índice de Gini, que mede a distribuição de renda, cairia 0,7%. Com gasto de R$ 3,5 bilhões, aumentando em 80% o benefício do programa, a queda seria a mesma.

Opinião contrária tem o economista da Unicamp Cláudio Dedecca, que vê no mínimo a principal saída. A recuperação recente de renda das famílias, segundo o estudo de Dedecca, não se restringiu aos estratos mais inferiores. Para o estudioso, a melhoria nas camadas mais pobres não pode ser associada apenas ao Bolsa-Família, devendo ser remetida aos efeitos da melhoria no mercado de trabalho e à política de valorização do salário mínimo.

"Estudos do Ipea mostram que 80% dos que recebem Bolsa-Família estão no mercado de trabalho. Se não aumentar o rendimento do trabalho, a dependência do programa de transferência de renda se amplia. O Bolsa-Família tem seu efeito na desigualdade limitado, a partir do momento que se alcance a população pobre. Mas nem Bolsa-Família e nem salário mínimo terão impacto se não houver crescimento na economia, é bom lembrar", analisa.

Defensor incondicional do Bolsa-Família, Marcelo Neri, diz que, num cenário de restrição orçamentária, é necessário fazer escolhas. "O Bolsa-Família é 2,2 vezes mais eficiente para reduzir a pobreza que o mínimo. Reduz a desigualdade mais rapidamente, com um custo bem menor. Se o programa for turbinado com políticas de acesso a crédito e de melhorias na educação, haveria portas de saída", considera.

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Saboia, mesmo reconhecendo que o mínimo não chega aos extremamente pobres, afirma que a valorização do salário combate mais a desigualdade. "O mínimo chega a 70% das famílias que ganham abaixo da renda média. O Bolsa-Família é um programa emergencial para tirar da pobreza extrema", confirma.

Lauro Ramos cita os efeitos negativos do aumento do mínimo: mais desemprego e informalidade. "O Bolsa-Família, sem qualquer eficiência na aplicação é mais poderoso no combate à desigualdade. A forma de melhorar os vencimentos no mercado de trabalho é aumentar a demanda por mão-de-obra", prossegue.

Marcio Pochmann diz que ambos os instrumentos são necessários para reduzir os abismos de renda. O Bolsa-Família atinge a pobreza extrema e o mínimo ameniza as distorções do mercado de trabalho. "O mínimo garante ganho aos menos qualificados. O Bolsa-Família precisa ganhar contorno de política de estado e não de governo, como é."