“Os melhores conteúdos antibolsonaro para você disparar nas suas redes”. É assim que se define o Bolsoflix, que também tem conta no Instagram, grupos de Whatsapp, Telegram e um site, no qual atualmente existem 68 vídeos contra o presidente Jair Messias Bolsonaro. No site, em uma espécie de trailer promocional, a página anuncia ser “o lar do pior vilão do mundo”, pior do que Thanos, da franquia Vingadores e Carminha, a vilã da novela Avenida Brasil, e se coloca como o “maior e melhor acervo onde encontrar o vídeo ideal contra Bolsonaro”.
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Sem perder tempo com teorizações ou debates aprofundados, os vídeos apostam em uma linguagem mais simples, no humor, na ironia e até na música para tentar viralizar suas pesadas críticas ao presidente. Outro detalhe chama a atenção: não se sabe quem são os responsáveis pela página.
Lançado há três meses, o Bolsoflix brinca com a lógica dos serviços de streaming e apresenta um “catálogo” com oito categorias distintas de vídeos: destaques, pandemia, corrupção, violência, mentiras, economia, miscelânea e arrependidos. Ao clicar em cada categoria, o internauta tem acesso a uma lista de vídeos, que contam até com uma espécie de sinopse. É possível assistir ao vídeo diretamente no site ou baixá-lo, para depois compartilhar.
Nas redes sociais, os números do Bolsoflix ainda são modestos: pouco mais de 6 mil seguidores no Instagram; 4,6 mil no Twitter; 9 mil no grupo do Telegram; e 14 grupos de WhatsApp – cada grupo pode ter no máximo 256 participantes. Mas, devido às características dos vídeos, alguns ganham rapidamente destaque, como o “Custo Bolsonaro”, um dos primeiros a viralizar. Vídeos com paródias musicais também são comuns no site, como “Abre o processo, Arthur Lira!” , usado em um episódio do programa de Gregório Duvivier no canal por assinatura HBO, Greg News.
Anônimo
Embora também reúna produções mais “caseiras”, provavelmente enviadas por colaboradores, a maioria dos vídeos parece ter sido feita por equipe especializada. Alguns resgatam notícias veiculadas na TV ou entrevistas antigas de Bolsonaro. Entretanto, em nenhum momento há identificação de quem seria o responsável pela produção do material. No mais recente deles, “Bolsopay”, por exemplo, a narração é feita pelo humorista da Porta dos Fundos, Fábio Porchat, mas nem essa informação consta do vídeo. Também não é possível saber quem são os responsáveis pelo site onde todos esses vídeos são disponibilizados.
O domínio utilizado, www.bolsoflix.com, foi registrado por meio de um serviço chamado Njalla, que tem sede na pequena ilha de Neves, nas Antilhas. O diferencial do serviço é justamente oferecer aos proprietários de sites garantia de anonimato. “Nós nos preocupamos com seu direito à privacidade. Acreditamos que é uma importante peça da democracia termos o direito de ser anônimos”, diz a empresa em seu site.
Por meio do Njalla, os clientes não compram diretamente os domínios, deixando que a empresa faça isso por eles, o que garante uma camada extra de proteção em caso de eventuais tentativas de rastreio ou invasão. O serviço foi criado por Peter Sundle, que tem bons motivos para defender o anonimato na rede. Ele é um dos fundadores do site The Pirate Bay, que, como o próprio nome indica, é um site voltado para o compartilhamento de arquivos e pirataria digital.
Em julho deste ano, o Pirate Bay foi bloqueado no Brasil durante uma operação que mirou 334 sites e 94 aplicativos usados para streaming ou download irregular de conteúdos audiovisuais. Em outros países, o Pirate Bay também foi alvo de ações judiciais e seus fundadores - incluindo o atual responsável pelo Njalla - foram condenados pela justiça sueca por violação a direitos autorais.
Proteção
No perfil no Twitter, o Bolsoflix explicou que o anonimato sobre a autoria dos vídeos e responsáveis pelo site é uma tentativa de proteção. “Não vamos esquecer que opositores do governo, pessoas como nós, estão sendo perseguidos todos os dias nesse país de mil formas diferentes”, escreveu o perfil.
A conta afirma ainda que desde o lançamento do site, em maio, já houve tentativas de derrubar o conteúdo. “Não tem nada de mirabolante: somos anônimos porque não queremos ser perseguidos. E não nos arrependemos, já que as tentativas de ataque já começaram”, escreveram. Mais adiante, o Bolsoflix diz ser “um coletivo autônomo, independente, de esquerda”, que não trabalha “para nenhum partido ou candidato” e que não conta “com grandes recursos jurídicos e por isso mesmo precisamos nos resguardar”.
Para o advogado especialista em Direito Digital, Emerson Grigolette, que analisou o site, essa tentativa de anonimato contraria a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “Essa ‘política de dados’ deles é um deboche à LGPD, pois eles coletam dados pessoais dos interessados - nome, celular e e-mail - e violam a LGPD, pois não têm termos de uso indicando controlador, operador encarregado, nem políticas de privacidade. Isso é bem grave e pode ensejar inclusive penalidades pela ANPD [Autoridade Nacional de Proteção de Dados]”, explica o advogado.
Segundo ele, nada impede que o site possa usar os dados coletados para fins ilícitos ou diversos da finalidade a que se propõe. Além disso, alerta Grigolette, pode haver uso de mecanismos maliciosos que comprometam a segurança de dispositivos.
Outro problema seria a questão do próprio conteúdo disponibilizado pelo site. “Uma coisa é protestar contra o governo, se indignar, criticar e, às vezes, até se exceder um pouco falando algo inapropriado. Outra completamente diferente é criar um site cujo único objetivo é depreciar a imagem e reputação”, avalia. Para ele, muitos dos materiais do site usariam “fake news e sensacionalismo em flagrante prática de calúnia, difamação e perseguição contra um chefe de governo e de Estado”.
Caso exista uma ação judicial por causa desses materiais, o especialista afirma que os responsáveis pelo site – que mesmo com a tentativa de anonimato poderão ser identificados – e também quem compartilhar os vídeos poderão ser processados.
Convencimento
Além de criticar Bolsonaro e aliados, os vídeos do Bolsoflix também pretendem ser uma ferramenta política. No próprio site há instruções de como compartilhar os materiais de forma mais eficiente. “Likes, compartilhamentos, retuítes, tudo isso é muito legal. Mas não quer dizer exatamente que determinado conteúdo funciona pra evitar que as pessoas votem no Bozo”, diz a página.
Mais adiante, há a orientação de que os vídeos devem ser compartilhados preferencialmente com “grupos da galera mais ou minion [...] aquele povo meio em cima do muro, que não se interessa tanto assim por política”. A explicação para essa estratégia seria a de que os indecisos são a parte que pode ser “convencida”. Há até um “Pequeno Manual de Como Reagir a Respostas de Bolsominions”, com argumentos para serem usados em conversas com partidários do presidente.
Títulos
Outra estratégia usada na promoção dos materiais é o uso de títulos chamativos para os vídeos, quase sempre trazendo o nome “Bolsonaro”. O presidente é chamado de ditador, miliciano, psicopata e até anticristo, além de ser apontado como responsável pela falta de vacinas, problemas na economia, falta de oxigênio em Manaus, entre outros.
Veja alguns dos títulos e sinopses dos vídeos disponibilizados no site:
- "Bolsonaro não quer te vacinar. Um ditador antivacinas toma o poder em meio a maior pandemia da história. Terror".
- "Bolsonaro é ligado a milícias. Família de políticos cariocas ganha poder fazendo esquemas de rachadinha com milicianos, e acaba elegendo o presidente de um país".
- "Bolsonaro é responsável pela falta de oxigênio em Manaus. Filme de terror onde genocida se inspira em Hitler para matar milhares de pessoas sufocadas".
- "Bolsonaro mente sobre o número de mortos. Um assassino serial tenta esconder os corpos de suas vítimas para poder seguir matando impunemente".
- "Bolsonaro promoveu aglomerações na pandemia. O anticristo está encarnado e pronto para levar um povo rumo ao abismo. Quem escapará das armadilhas desse falso profeta?"
- "Faltam leitos de UTI e a culpa é de Bolsonaro. O presidente de um pequeno país latinoamericano decide cometer genocídio contra a população mais pobre em meio à maior pandemia do século. Vai faltar leito de UTI".
- "A Rachadinha dos Bolsofilhos. Aprenda como desviar dinheiro público com a família Bolsonaro e compre já uma casa no valor de R$ 6 milhões enquanto o resto do país passa fome".
- "Bolsonaro é doente. O caso raro de um psicopata que abusa sexualmente de animais. PG18+"
- "Quem vota Bolsonaro também vota Jairinho. Um remake de 'Todos os homens do presidente' estrelando um miliciano que assassina crianças".
- "Verde, amarelo e bandeira na mão. Zumbis tomam as ruas de verde amarelo, espalhando uma pandemia mortal".
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