• Carregando...

Criminalização da homofobia só será discutida em 2015

O projeto de lei 122, que criminaliza a homofobia, tramita há oito anos no Congresso. Visto por especialistas como principal instrumento para diminuir o número de assassinatos e atos violentos contra homossexuais, a mobilização de grupos religiosos fez o texto parar no Senado. A expectativa dos parlamentares é de que só retorne à pauta em 2015.

Apresentada em 2006 na Câmara dos Deputados, a proposta prevê penas de até 5 anos de prisão para quem cometer atos diretos ou indiretos de discriminação ou preconceito motivado pela orientação sexual. O texto já foi aprovado na Câmara dos Deputados. Após uma grande negociação no Senado, o termo homofobia até foi excluído do texto. A proposta era enquadrar o delito como crime de ódio, com as mesmas regras válidas para o racismo. Mesmo assim, a discussão não avançou.

A cada hora, um homossexual sofre algum tipo de violência no Brasil. Nos últimos quatro anos, o número de denúncias ligadas à homofobia cresceu 460%. Segundo números obtidos pelo Estado, o Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDHPR), registrou 1.159 casos em 2011. Neste ano, em um levantamento até outubro, os episódios de preconceito contra gays, lésbicas, travestis e transexuais já superam a marca de 6,5 mil denúncias.

Os jovens são as principais vítimas dos atos violentos e representam 33% do total das ocorrências. A cada quatro casos de homofobia registrados no Brasil, três são com homens gays. Estudante de Direito na USP, André Baliera, de 29 anos, foi espancado em 2012 por dois homens no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo. Ele voltava a pé para casa pela Rua Henrique Schaumann quando dois jovens o ofenderam por causa de sua orientação sexual. Depois de uma discussão, acabou agredido pela dupla.

"Nos primeiros dias, não saía de casa. Fui ao psiquiatra, tomei remédios e fiquei seis meses sem passar na frente do posto em que fui agredido", conta Baliera. Quase dois anos depois, receio e medo ainda estão presentes no dia a dia, assim como o preconceito. "Em junho deste ano, estava com meu namorado assistindo a um filme em Santos e fomos xingados de 'viados' dentro do cinema. Chamei a polícia na hora", disse.

Para a SDHPR, o crescimento das denúncias é um fator positivo para combater a violência homofóbica. A coordenadora da área LGBT, Samanda Freitas, diz que o desafio é apurar os crimes. "Precisamos melhorar o atendimento desses casos e isso passa por um treinamento dos policiais para que identifiquem os crimes de ódio LGBT e investiguem com o mesmo cuidado que as demais ocorrências", afirmou.

Cerca de 26% dos casos acontecem nas ruas das grandes cidades. Em 2007, a transexual Renata Peron voltava de uma festa com um amigo quando nove rapazes os cercaram na Praça da República, centro da capital paulista. Trinta minutos de violência foram tempo suficiente para chutes, socos, xingamentos, três litros de sangue e um rim perdidos por Renata.

"Ninguém foi preso e fica um sentimento de pena. Nem bicho faz essas coisas. Passei seis meses fazendo terapia para entender a razão de ter sido agredida."

Assassinatos

O filho de Avelino Mendes Fortuna, de 52 anos, não teve a mesma sorte. Nesta quinta-feira (20) fez dois anos que Lucas Fortuna, de 28, morreu assassinado em Santo Agostim, no Grande Recife, em Pernambuco. Jornalista, foi espancado por uma dupla de homens e jogado ainda vivo no mar. Os assassinos foram presos e confessaram o crime por homofobia, mas no inquérito a polícia trata o caso como latrocínio.

Depois da morte, Avelino virou ativista na ONG Mães pela Igualdade, que luta pelo fim da discriminação contra homossexuais e pelo engajamento dos pais LGBTs na vida de seus filhos. "O pai que não sai do armário juntamente com seu filho se torna cúmplice da morte e da agressão dele no futuro", afirmou. "Um dos nossos objetivos é fazer com que os pais participem, lutem pelos direitos da sua família."

Preconceito

A discriminação e a violência psicológica, no entanto, estão entre as ocorrências mais comuns registradas na SDHPR e delegacias especializadas em Direitos Humanos. Cerca de 76% dos casos são de homossexuais que sofrem preconceito no trabalho, assédio moral e perseguição. No Maranhão, o professor universitário Glécio Machado Siqueira, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), tem sido alvo de ofensas pelos estudantes de Ciências Agrárias. "Desde o começo do ano, recebo ameaças, injúrias e boicotes das minhas aulas por causa da minha orientação sexual. Entrei em contato com todas as instâncias da universidade e a resposta que recebi foi o silêncio", reclama.

A Organização dos Advogados do Brasil (OAB) entregou queixa-crime para a UFMA. A reportagem entrou em contato com a universidade, que não se manifestou. "É triste ver que em uma universidade, onde estamos para expandir conhecimentos, acontece essa homofobia velada. A minha tristeza foi convertida em luta pelos direitos humanos. Espero que mais homossexuais tomem coragem para fazer o mesmo."

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]