Mentor do mote “pátria educadora”, Mangabeira Unger foi exonerado do cargo de ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) na quarta-feira, 16, o que deve enterrar de vez o projeto que deveria ser prioritário neste segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Desde o início do ano a educação vinha sofrendo com as restrições orçamentárias do governo federal, e a revisão no Projeto da Lei Orçamentária de 2016 mostra que o aperto continuará. Esse desfecho contradiz não só o discurso feito pela presidente na posse, em 1º de janeiro, mas também todo o esforço implantado pela União no período de 2004 a 2014, quando a educação foi privilegiada com o maior aporte de recursos de todas as áreas.
“Prioridade das prioridades”
No discurso de posse, a presidente Dilma Rousseff declarou que, com o lema “pátria educadora”, a educação seria a “prioridade das prioridades” e passaria a receber um volume crescente de recursos, por meio dos royalties do petróleo e do fundo social do pré-sal. Na verdade, essa expectativa não se concretizou, por causa de alguns obstáculos.
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu o novo regime de partilha dos recursos dos royalties. Além disso, a baixa no preço do barril e a queda nos investimentos da Petrobras após a deflagração da Lava Jato prejudicaram a extração de petróleo.
Além de não receber recursos extras, a educação também vem sofrendo cortes orçamentários. Em maio, o governo federal anunciou contingenciamento de R$ 9,4 bilhões na pasta. Em 2016, o orçamento previsto para o Ministério da Educação cairá para R$ 96,5 bilhões, contra os R$ 103,6 bilhões estimados inicialmente para 2015. (RF)
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Um levantamento do consultor legislativo do Senado Marcos Mendes mostra que, no conjunto das despesas obrigatórias da União, os recursos destinados à educação cresceram 130% em dez anos. Esse porcentual supera mesmo o de programas de grande vulto na administração petista, como o Bolsa Família (alta de 90%) e fica bem acima do observado em outras áreas essenciais, como benefícios previdenciários (variação de 9%) e gastos com saúde (2%).
Governo deveria investir mais em educação básica
Autor do estudo que aponta a elevação de gastos da União em educação, o consultor legislativo Marcos Mendes faz algumas críticas ao governo federal. Ele avalia que os investimentos na educação básica deveriam ser priorizados, ao contrário do que o governo federal vem fazendo, que é priorizar o ensino superior.
À reportagem, Mendes defendeu a cobrança para cursar uma universidade pública, com previsão de bolsas de estudos para quem não pudesse pagar. “Isso permitiria redirecionar verbas públicas para a educação básica. Deveria ser dada mais autonomia às universidades para buscar recursos privados por meio de convênios, prestação de serviços, captação de doações, entre outros”, afirmou.
Além disso, ele criticou a falta de avaliações das políticas públicas, para verificar a necessidade de um novo programa ou o acompanhamento dos benefícios gerados pelos programas implantados.
O Ministério da Educação (MEC), por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa, afirmou que “a tese de privilégio para o ensino superior não se confirma”. O órgão considera apenas o investimento público direto nas instituições públicas de ensino e informa que o porcentual destinado à educação básica em relação ao PIB passou de 3,2% em 2000 para 4,4% em 2013. No mesmo período, diz o MEC, a participação do investimento em ensino superior variou apenas de 0,7% para 0,8% do PIB. A assessoria informou que os dados podem ser consultados na página de Estatísticas do Inep, na opção indicadores financeiros.
O MEC afirmou ainda que monitora, junto com estados e municípios, todas as ações e programas da pasta e que tem “indicadores de qualidade para aferir a qualidade da educação infantil até a pós-graduação”. ( RF)
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No artigo “A Despesa Federal em Educação: 2004-2014”, Mendes, que é doutor em Economia, mostra que as despesas na área superaram o mínimo exigido pela lei. A Constituição Federal determina que a União aplique 18% da receita de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino. Durante todo o período, o porcentual aplicado foi maior, fechando o ciclo na casa de 24% do total da arrecadação com impostos. Nos últimos três anos, isso significou um aporte extra de R$ 43,1 bilhões.
Pelo estudo, o dinheiro aplicado na área realmente priorizou os investimentos, que aumentaram quase doze vezes, passando de R$ 729 milhões em 2004 para R$ 8,6 bilhões em 2014. Com isso, a parcela destinada aos investimentos passou de 3% para 9% das despesas totais com educação. A folha de pagamento, por sua vez, teve aumento de 150%, mas sua participação nos valores pagos caiu de 49% para 32%.
Detalhando ainda mais os gastos, Mendes mostra que a etapa de ensino que teve mais privilégios orçamentárias foi a educação profissional e tecnológica, com uma variação de 1.533% nos valores recebidos – passou de R$ 436 milhões para R$ 7,1 bilhão. Também teve variação expressiva a concessão de financiamento para estudantes, por meio do Fies e antecessores. Segundo Mendes, ainda que isso corresponda a um empréstimo que deve ser revertido ao caixa do governo no futuro, a dinâmica do Fies é semelhante ao de outra despesa corrente.
Insustentabilidade
Em entrevista à Gazeta do Povo, o consultor disse que a intenção do estudo foi analisar a insustentabilidade do crescimento do gasto na educação nos moldes feitos pelo governo federal. “Tal insustentabilidade ficou demonstrada pelos cortes já realizados em 2015”, afirma. Sobre ter sido ou não uma “pátria educadora”, Mendes disse que seria preciso analisar a qualidade dos programas, e que são poucas as ferramentas para isso.
“Novo” Fies atinge quem sonha com medicina
O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) passou por uma reestruturação em 2015, o que deve diminuir o ritmo de crescimento observado no período de 2004 a 2014. O MEC passou a exigir que os candidatos não zerem em redação do Enem e tenham média de pelo menos 450 na prova. O problema, na opinião de Fernando Carbonieri, (foto), diretor do portal Academia Médica, é a nova taxa de juros, de 6,5% ao ano, e a limitação da renda per capita, de 2,5 salários mínimos.
Carbonieri sentiu na pele a importância do Fies para a educação: o financiamento do governo federal bancou metade do valor da mensalidade na Faculdade Evangélica. Agora ele está quitando o saldo devedor, mas, como é um contrato antigo, a taxa de juros incidente é de 3,4% ao ano. Pelas novas regras, diz ele, fica inviável para um jovem da classe média frequentar um curso na área biológica. “Se uma faculdade custa R$ 5,8 mil, como fazer?”, critica.
O Ministério da Educação afirma que as mudanças do financiamento tiveram como objetivo aperfeiçoar o processo adotado até então para seleção de estudantes e instituições. (RF)
Década Educadora
O PASSADO
De todas as despesas obrigatórias da União, a educação foi privilegiada no período entre 2004 e 2014, segundo estudo da Consultoria Legislativa do Senado. Os recursos alocados para a área cresceram mais do que o de outras.
Áreas sociais
Despesas em áreas sociais (em % da receita líquida do Tesouro Nacional)
Na prática, a União tem aplicado mais do que determina a Constituição Federal - no mínimo, 18% das receitas de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino.
A injeção de recursos permitiu ampliar os investimentos, e as despesas correntes, como folha de pagamento, ficaram em segundo plano:
Despesa do governo federal com folha de pagamento e ações de investimento.
Os investimentos na área da Educação que tiveram maior aporte foram o Fies e o Fundeb, e eles subiram bastante na proporção ao PIB brasileiro:
Despesa do governo federal em Educação com Fies e Fudef/Fundeb (em % do PIB)
Além dos gastos diretos, o governo federal também implantou políticas públicas de isenções e desonerações, como os descontos no Imposto de Renda e ProUni, que podem ser considerados gastos tributários com educação.
Despesas do orçamento geral da união e gastos tributários do governo federal na área da Educação (em R$ bilhões).
O PRESENTE
Qual o retorno desses investimentos para a sociedade? Não é fácil dizer, pois a avaliação de políticas públicas ainda é falha. Um dos problemas, segundo o estudo, é que a União privilegiou os investimentos na educação superior e profissional.
Participação no total dos programas por etapa de ensino:
O FUTURO
O ajuste fiscal do governo federal está provocando cortes em todas as áreas, inclusive na Educação. As despesas estão sendo contingenciadas, e para 2016 haverá cortes no Ministério da Educação.
"Há risco de corte ainda maior. Na apresentação feita nesta semana, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa indicou que serão afetados:
- Fies;
- Pronatec;
- Ciência Sem Fronteiras;
Fonte: Marcos Mendes e Ministério do Planejamento.
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