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O pai de Jamile Aragão é católico; a mãe, evangélica e a irmã, espírita.  A jovem  agora é muçulmana  e frequenta a mesquita de Foz do Iguaçu | Marcos Labanca/Gazeta do Povo
O pai de Jamile Aragão é católico; a mãe, evangélica e a irmã, espírita. A jovem agora é muçulmana e frequenta a mesquita de Foz do Iguaçu| Foto: Marcos Labanca/Gazeta do Povo

Abrangência

Religião não é só para árabes

Em Foz do Iguaçu, não há estimativas de quantas pessoas se converteram ao islamismo, mas segundo o sheik da mesquita Omar Ibn Al-Khatab e Imam da Comunidade Islâmica de Foz do Iguaçu, Mohsin Alhassani, há inúmeros homens e mulheres de outras religiões e nacionalidades, incluindo paraguaios e argentinos, que optam pelo Islã.

Quando o assunto é a adesão de novos seguidores, Alhassani não se surpreende com a simpatia de brasileiros e pessoas de outras nacionalidades ao islamismo. "Muita gente erra quando pensa que o Islã foi mandado somente para os árabes porque surgiu na península árabe. O Islã não é apenas uma religião de árabes, mas para qualquer pessoa interessada", diz.

O sheik ainda esclarece: nem todo árabe é muçulmano. Há árabes católicos, cristãos e aqueles que não seguem nenhuma religião.

Fundado pelo profeta Maomé no início do século 8, o Islamismo tem hoje cerca de 1,4 bilhão de adeptos espalhados por cinco continentes. A Indonésia é o país com o maior número de seguidores, cerca de 184 milhões. No Brasil, o censo do ano 2000 registrou cerca de 27 mil muçulmanos, mas segundo os religiosos hoje o número é bem maior. Muçulmanos brasileiros chegariam a 400 mil.

Traje religioso desafia o calor na fronteira

O uso do véu (hijab) é um dos traços culturais que mais chamam atenção daqueles que não são muçulmanos, principalmente das mulheres. Em Foz do Iguaçu, onde o calor chega aos 40ºC no verão, as brasileiras não-muçulmanas questionam a adoção do traje, que acompanha roupas folgadas que cobrem todo o corpo. Mas quem usa, pouco se importa.

As muçulmanas se dizem protegidas ao usar o acessório. Quanto ao calor, alegam sentir-se melhor do que parece porque os trajes as protegem do sol. "A mulher tem de conhecer a religião para saber os motivos pelos quais usa o véu", diz Jane Cristina Schiaui, 35 anos. Natural de Capanema, ela mudou-se para Foz do Iguaçu para estudar. Casou-se com um muçulmano e acabou se envolvendo com o islamismo. A afinidade também vem do berço. Raquel Oliveira Diniz, 36 anos, que era evangélica, diz que a filha de 9 anos pede para usar o véu.

A adoção do véu é uma norma do islamismo registrada no Alcorão (livro sagrado para os muçulmanos), uma das ordens que Deus enviou aos muçulmanos, como explica o sheik Mohsin Alhassani. "A mulher é chamada a se proteger, a cobrir seu cabelo e se vestir com roupa adequada, seja durante os momentos da oração ou no dia a dia." Conforme o sheik, ao contrário da mulher, o homem não precisa se cobrir porque não chama atenção como a figura feminina. O sheik lembra da diferença entre o véu e a burka. O véu é usado pelos mu­­çulmanos, a burka não. "Não é um ato islâmico, é um costume afegão", explica.

Elas são brasileiras, cresceram em meio a costumes ocidentais, mas com o passar do tempo decidiram dar outro tom à vida. Jane e Jamile são o retrato de uma geração que tem optado por algo cada vez mais comum na tríplice fronteira: seguir o islamismo.

Com duas imponentes mesquitas, Foz do Iguaçu – cidade de 320 mil habitantes situada entre o Paraguai e a Argentina –, transformou-se em um portal de entrada para novos seguidores do Islã. A difusão da doutrina pela internet e a convivência harmoniosa de brasileiros com os cerca de 20 mil árabes e descendentes da região trinacional, a segunda maior comunidade do Brasil depois da paulistana, facilitam a aproximação com a religião fundada pelo profeta Maomé.

A maior parte de homens e mulheres que se converteu ao islamismo, ou como os muçulmanos dizem ‘se reverteu’ – para o Islã todos nascem muçulmanos, mas são tirados do caminho e por isso se revertem e retornam à religião – casou-se com muçulmanos. Mas há histórias que fogem à regra. A da estudante Jamile Barreto de Aragão, 21 anos, é uma delas.

De árabe, Jamile só tem mesmo o nome. Baiana de Paulo Afonso, ela chegou a Foz do Iguaçu há cinco anos, depois que a mãe decidiu abrir uma confeitaria na cidade. Aos poucos, aprendeu a admirar o caráter multiétnico de Foz do Iguaçu, onde vivem representantes de 74 etnias, e resolveu dar aulas de espanhol pela internet. Entre um contato e outro, conheceu muçulmanos de outros países e começou a aprender com eles, além do inglês, os princípios do islamismo. O interesse de Jamile pelo Islã cresceu e, depois de pesquisar sobre a religião, procurou uma das mesquitas em Foz do Iguaçu, falou com um sheik e se converteu. Ou, como ela mesmo diz, voltou para o Islã. "Antes de conhecer não tinha muita informação e pensava que o Islã estava associado ao terrorismo", diz.

Satisfeita na condição de muçulmana, Jamile, que era católica não praticante, hoje usa véu, reza em direção à Meca cinco vezes ao dia, conforme um dos cinco pilares do islamismo, e sente-se em casa quando frequenta a mesquita sunita Omar Ibn Al-Khatab. "Tenho parte da cultura do meu país, mas hoje eu tento agregar valor da cultura islâmica", diz ela, ainda com uma ponta de sotaque da Bahia.

Apesar do nome, a família de Jamile não é de origem árabe. A mãe é evangélica, o pai católico e uma irmã, espírita. Todos convivem bem, diz ela, sorrindo.

Retorno

A conversão ao islamismo é simples. Em Foz do Iguaçu, os candidatos frequentam aulas sobre os pilares da doutrina, que podem durar semanas, conforme o tempo disponível; assistem a sermões em português e leem obras sobre o tema. No ato da conversão é pronunciada a frase: "Não há outra divindade além de Deus e Mo­­hammad, seu profeta mensageiro". Passado o ritual, o muçulmano recebe um certificado escrito em árabe e português que o ajuda a tirar o visto na Embaixada Saudita para fazer a peregrinação à Meca (o muçulmano tem de ir pelo menos uma vez na vida à Meca). O documento também facilita que seu funeral seja feito em cemitério islâmico.

Mesmo as brasileiras convertidas costumam dedicar-se ao estudo da doutrina. Na Mesquita Imam Al-Khomeini, da linha xiita, um grupo de mulheres brasileiras e paraguaias reúne-se todas as quintas-feiras para aulas de árabe clássico. Elas também têm aulas sobre os princípios do islamismo com o sheik Mohamad Khalil. "A sabedoria não tem fim, o ser hu­­ma­­no tem de procurar o conhecimento. Existem muitos detalhes sobre história na religião", diz o sheik.

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