A percepção do brasileiro sobre a situação da saúde no país é ruim. Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha, encomendada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), revelou que 92% dos entrevistados consideram insatisfatórios os serviços prestados pelo setor. Quando a avaliação é do Sistema Único de Saúde (SUS), o índice de insatisfação tem uma ligeira queda e marca 87%. Paradoxalmente, as piores notas atribuídas à saúde pública foram dadas por aqueles que possuem planos de saúde. A pesquisa ouviu 2.418 brasileiros, em todas as regiões do país, e foi divulgada em agosto. Os entrevistados tinham de atribuir notas de 0 a 10, considerando a escala de péssimo a excelente (veja infográfico ao lado).
Nos últimos dois anos, 92% dos entrevistados afirmaram que buscaram algum serviço do SUS e 89% dizem que conseguiram usar o sistema. A busca é maior por remédio distribuído gratuitamente, consultas e atendimentos nos pontos de saúde, onde o índice de pessoas que obtiveram o benefício também é mais alto. As dificuldades de acesso estariam na busca e realização de procedimentos de quimioterapia, radioterapia, hemodiálise, cirurgias e atendimento domiciliar.
Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), Mauricio Marcondes Ribas, os problemas da saúde são semelhantes em todo país e não são restritos ao setor público. "Os planos de saúde não ficaram isentos de reclamação. O que a gente tem batido insistententemente é o subfinanciamento. Além de ser pouco, o dinheiro é mal aplicado."
A avaliação vem ao encontro do que pensa o secretário de Saúde de Curitiba, Adriano Massuda. "Hoje, os maiores desafios da saúde são melhorar a capacidade produtiva e trabalhar o aspecto financeiro, já que há subfinanciamento no país todo", reflete.
Para aumentar a produtividade do sistema, o ideal é que a maioria das pessoas que procura atendimento o recebesse na rede de atenção básica, e não usasse os hospitais como porta de entrada. A pesquisa revela que 49% dos entrevistados procuram pronto-socorros, hospitais e UPAs para conseguir acessar o sistema e 48% buscam atendimento nas unidades básicas.
"A rede básica deveria fazer atendimento a 80% das situações. Como não é resolutivo, ou porque o médico não tem condição de fazer uma medicina melhor, tudo cai nas emergências, que ficam estranguladas", analisa Ribas. Para ele, também é preciso considerar o raciocínio de muitos pacientes que, por saberem que muitos hospitais estão ligados à universidades, associam o serviço especializado à maior qualidade no atendimento e ignoram a rede básica.
Para Massuda, é preciso inverter esse modelo assistencial da saúde, que já foi muito calcado na rede hospitalar. "Hospital é caro para manter, então destina os recursos para as doenças mais graves", diz. Em Curitiba, a tentativa é de fortalecer a rede básica, ampliando o horário de atendimento para conseguir atingir um público maior, e buscar mais resultados nas consultas, para evitar o encaminhamento ao serviço especializado sem necessidade.
Família sofre à espera de atenção
Gesli Franco, da sucursal
Com encaminhamentos médicos nas mãos, a empregada doméstica Léia de Oliveira da Silva, 43 anos, é mais uma paranaense à espera de atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Com uma hérnia no estômago e dois nódulos no pescoço, ela aguarda há quase um ano para receber tratamento adequado em Maringá, Noroeste do Paraná.
A primeira procura foi em outubro de 2013. Sentindo fortes dores no estômago, ela buscou a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e recebeu medicamento intravenoso, sem qualquer diagnóstico do problema. Dias depois, as dores persistiram. Foi quando decidiu ir ao posto de saúde. Chegando lá, diz Léia, a indicação foi de que deveria procurar a UPA. Já sem conseguir andar por causa da dor, ela finalmente conseguiu ser submetida a exames que detectaram uma hérnia de hiato no estômago.
O tratamento segue à base de remédios para controlar os sintomas, mas a doméstica diz sentir diariamente os incômodos e aguarda pela cirurgia feita por laparoscopia. "Eu volto no consultório e o médico diz que precisa esperar um pouco mais para operar, mas eu estou cansada de esperar. É difícil ter que acordar cedo todos os dias para trabalhar sentindo tantas dores." Ela já perdeu 10 quilos desde que adoeceu.
O drama foi agravado depois de descobrir dois nódulos no pescoço. Em dez meses, foram três consultas com o especialista. Na última, em maio deste ano, Léia conta que o médico teria pedido para ela aguardar mais quatro meses para ver a evolução dos caroços. "É uma humilhação o que fazem com a gente. Até agora não me pediram uma biópsia. Às vezes eu não durmo com medo do que pode acontecer."