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Recentemente estive em São Paulo para um evento da indústria de cosméticos. Havia jornalistas do Brasil inteiro. Conheci quatro delas durante um jantar. Estávamos na mesma mesa e, conversa vai, conversa vem, logo elas começaram a mostrar o celular uma para a outra: eram as fotos de seus cachorrinhos. Nenhuma delas tinha filhos.

Eu, que atualmente não tenho nenhum bicho de estimação, fiquei um tanto alheia à conversa, enquanto elas discutiam sobre o melhor antipulgas ou como limpar as patinhas depois de um passeio fora de casa. Minha atenção voltou à conversa quando alguém disse: "Uma amiga diz que ter cachorro é igual ter um filho ‘autista’, porque você tem que passar a vida inteira dando banho, dando comida...". "Credo, menina!", interrompeu outra. "Ter cachorro é muito melhor do que ter filho ‘autista’, né? Imagina...".

Imagino que a expressão "boquiaberta" seja pouco para descrever minha reação naquele momento. Em segundos, lembrei de toda a vida do meu filho de quase 5 anos. Toda a felicidade, satisfação e realização que ele trouxe para minha vida e o quanto ele é feliz, amado e admirado por todos que o conhecem. Ele tem autismo, mas não é possível imaginar que alguém trocaria sua companhia (ou existência!) pela de um cachorro – com o perdão da ironia –, por mais perfumado e limpinho que seja. Com os pensamentos de volta à mesa, eu ponderei se devia falar alguma coisa, mas preferi me poupar de um constrangimento maior, pedi licença e me retirei. Eu já sabia que o autismo não escolhe tom de pele, classe socioeconômica ou grau de escolaridade. Naquela noite, descobri que a ignorância e a insensibilidade também não o fazem.

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