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Cadáveres amontoados resumem caos no IML

A equipe da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PR saiu horrorizada da vistoria feita ontem na unidade de Curitiba | Hugo Harada/Gazeta do Povo
A equipe da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PR saiu horrorizada da vistoria feita ontem na unidade de Curitiba (Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo)
Corpos empilhados e sem identificação no IML de Curitiba: uma cena que choca pelo descaso das autoridades públicas |

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Corpos empilhados e sem identificação no IML de Curitiba: uma cena que choca pelo descaso das autoridades públicas

A situação do Instituto Médico-Legal (IML) de Curitiba é pior do que se imagina: além da notória falta de equipamentos e de pessoal, a estrutura precária da sala de radiologia da unidade provoca a emissão descontrolada de radioatividade e o armazenamento inadequado de dezenas de corpos causa o vazamento de chorume – líquido preto proveniente da decomposição biológica. Essas denúncias contra o IML da capital foram comprovadas ontem durante vistoria feita pela Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil seção Paraná (OAB-PR). Hoje a Secretaria Municipal de Meio Ambiente deve averiguar o local. A situação pode causar a interdição do local.A inspeção da OAB-PR na unidade teve como objetivo apurar as deficiências estruturais e de pessoal que acarretam no atraso da liberação de corpos e em riscos à saúde pública. "É um caos e providências deverão ser tomadas. Intervenção no papel, como já ocorreu em outra época, não adianta", afirmou a vice-presidente da comissão da OAB-PR, Isabel Kugler Mendes, ao final da visita. No começo deste mês, a Gazeta do Povo publicou reportagem informando sobre a grave situação do IML.

As denúncias foram relatadas ao diretor-geral do IML, o médico Porcídio Otaviano Milani. A maioria das falhas foi reconhecida pelo gestor. Ele negou apenas a existência de problemas na sala de radiografia. Segundo ele, o excesso de cadáveres é um caso antigo. "Tem aumentado o número de mortes violentas e, ao mesmo tempo, temos falta de espaço para enterrar", justificando o não cumprimento do prazo de 30 dias para o enterro coletivo dos corpos não identificados.

Milani afirma que medidas emergenciais estão sendo tomadas para resolver os problemas. Entre elas estão a contratação de funcionários, a regularização do trabalho efetuado pelo IML e o pedido para que a prefeitura tome providências quanto ao espaço público para o enterro. Para Milani, o pequeno número de médicos legistas, que hoje chega a 73 profissionais em todo o Paraná, também auxilia no atraso dos procedimentos. O ideal seria 160 médicos para atender à demanda do estado.

Diagnóstico

Durante a vistoria, que durou uma hora e meia, a farmacêutica Priscila Gabriel, chefe da divisão de laboratórios do IML, explicou que o cromatógrafo (equipamento usado para fazer exames toxicológicos em vítimas a fim de identificar substâncias químicas no corpo) não está funcionando desde novembro de 2010. "A consequência é o atraso de toda a cadeia de exames", afirma. Segundo ela, hoje são 1,5 mil exames em atraso. A demora na entrega dos resultados cria transtornos na liberação de corpos para cremação e na conclusão de inquéritos policiais.

Priscila lembra ainda que o número de laboratórios para exames também é insuficiente. Atualmente, dois laboratórios concentram todos os diagnósticos do estado. Em Curitiba, o trabalho é feito por 16 profissionais e, em Londrina, por apenas dois. Para a especialista, a criação de novos laboratórios descentralizados ajudaria a resolver o problema.

A falta de viaturas para a coleta de corpos foi citado pelos funcionários. Somente duas estão em funcionamento, sendo que há oito motoristas à disposição.

Isabel Kluger, da OAB-PR, conta que costuma ouvir que a Justiça tem sido morosa na liberação dos corpos. "Quando não tem autoria definida a Justiça fica responsável e não consigo entender o motivo de levar tanto tempo para liberar os corpos", diz. A Vara de Inquéritos Policiais foi procurada pela reportagem e deve se pronunciar hoje.

Cheiro forte denuncia descaso

Quem entra nas dependências do necrotério do IML não imagina o existe por trás de algumas portas. O cheiro característico de putrefação é o primeiro a ser percebido. Depois, a realidade nua e crua ao ver dezenas de corpos ensacados em plásticos pretos que mal cobrem alguns deles.

Os existentes na primeira câmera fria que aloja 46 gavetas estão em melhor estado, segundo a OAB-PR. No entanto, a água encontrada no chão denuncia o mau funcionamento das geladeiras – antigas, enferrujadas e que mesmo passando por vistorias constantes, segundo a funcionária responsável por ser a cicerone do grupo, não comportam o uso constante. Seis corpos recém-chegados aguardam a liberação fora das geladeiras. Há corpos armazenados que datam de 2009.

Mesmo informando que há material descartável disponível, como aventais, gazes, luvas e máscaras, para manipulação dos corpos, nenhum dos funcionários que circulam pelo espaço fazem uso de equipamentos de proteção. "Nunca me contaminei", garante uma delas. A única coisa descartável que se vê são as lonas pretas que revestem os corpos, utilizadas desde que o atual diretor assumiu. Antes, segundo informações, eram dispostos pa­­péis sobre os corpos nus. São 300 sacos pretos usados semanalmente em substituição aos sacos de zíper que foram usados por pouquíssimo tempo sob alegação de serem muito caros.No entanto, o mais desumanizante é ver a câmara onde se encontram cerca de 70 corpos, conforme avaliação de funcionários, empilhados um sobre os outros, com partes semi-expostas. Quando é necessário fazer um reconhecimento, como o ocorrido com os familiares de Nilton Lopes Santana, 27 anos, foi preciso remover dezenas de corpos para tentar localizá-lo. O corpo está sumido desde 19 de janeiro. O IML reconheceu que o corpo pode ter sido enterrado como indigente.

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