O motorista Ednaldo Barbosa, a psicóloga Maria Lúcia Soares Terra e o advogado Eduardo Salles Pimenta Filho têm algo em comum entre si e com empregada doméstica Doralice Muniz Barreto, de Jundiaí, que teve de tirar a blusa para entrar no banco.

CARREGANDO :)

Todos foram barrados em portas giratórias de banco, guardam más recordações dos episódios e tentam levar as instituições financeiras à Justiça para obrigá-las a pagar indenizações por danos morais - o que nem sempre é fácil.

Polêmica nacional, as portas giratórias ainda não foram analisadas pelo Superior Tribunal Federal (STF), mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) - instância para onde sobem todos os recursos contra tribunais estaduais - já acumula seis acórdãos e 89 decisões individuais de ministros sobre o assunto.

Publicidade

Advogados que entendem do tema afirmam que juízes tendem a ser conservadores para não estimular uma suposta indústria de indenizações, mas, em alguns casos, cedem aos argumentos de clientes que se sentem humilhados.

Estagiário de direito, Eduardo Salles Pimenta Filho nunca mais voltou à agência do Banco do Brasil da Avenida Rebouças, em São Paulo, onde conta ter sido impedido de entrar, em novembro de 2007, porque usava botas de couro com prendedores de cadarço metálicos.

"Ficou uma coisa meio cara-de-pau. Abusaram do meu direito de entrar na agência. Ter que voltar lá me parecia meio absurdo", afirmou. Eduardo lembra que teve de chamar a polícia para conseguir entrar na agência, o que só conseguiu depois de passar por um detector de metais portátil.

Além do processo por danos morais por ter sido barrado na porta, Eduardo acusa o banco de usar dados sigilosos - extratos de sua conta corrente - como peça de defesa. De acordo com ele, o advogado da instituição financeira apresentou os extratos para provar que ele fez a inscrição para o exame da Ordem no mesmo dia em que foi barrado. "Entrei com outra ação, em decorrência de o banco dar extratos ao processo para fazer prova. É uma prova ilícita." Procurado pelo G1, o Banco do Brasil não quis se manifestar sobre o processo.

Portadora de uma doença que a impede de se locomover sem cadeira de rodas, Maria Lúcia Soares Terra afirma que foi impedida de entrar pela porta giratória em agosto de 2008. Segundo seu advogado, André Felipe Fogaça, também ficou esclarecido que ela não poderia entrar de muletas ou amparada por outra pessoa.

Publicidade

Outra alternativa, a porta para deficientes, só poderia ser usada se ela mostrasse documentos para provar sua enfermidade. Sem alternativa, conta o advogado, Maria esperou 50 minutos, ao fim dos quais chamou a polícia. Ainda assim, teria sido atendida do lado de fora da agência.

Lúcia assistirá no próximo dia 23 a uma audiência em que o juiz decidirá se a agência do HSBC no Itaim Bibi pode ou não barrar alguém que usa cadeira de rodas ou muletas.

De acordo com o advogado, sua cliente já foi vítima outras duas vezes do mesmo tipo de situação, na agência da Brigadeiro Luís Antônio, em outubro de 2006 e em dezembro de 2007.

Na ação que Lúcia moveu por causa do primeiro episódio, o banco foi condenado em definitivo a pagar indenização de R$ 3 mil. No segundo caso a condenação foi maior, de R$ 20 mil, mas a instituição ainda tem espaço para recorrer. "Esse é o exemplo de que um mesmo raio caiu três vezes sobre a mesma pessoa", disse Fogaça.

"A Lúcia foi discriminada e passou por situação muito vexatória frente aos outros clientes. E os funcionários não demonstram em momento algum porque estão fazendo isso e em nenhum momento conseguem demonstrar porque estão fazendo isso", disse Fogaça. Em nota, o HSBC informou que lamenta o tratamento dedicado à cliente, mas ressalvou que a porta evita assaltos.

Publicidade

O advogado de Lúcia afirma que sua cliente vive uma situação muito especial e recomenda cautela aos clientes que pensam em processar o banco porque ficaram presos na porta.

"A tendência é que os tribunais tentem evitar ao máximo a indústria da indenização. Em outros países, um escorregão dentro da loja rende 100 mil dólares. Aqui no Brasil, o juiz só condena se ver que houve uma humilhação. Só vale entrar na Justiça se houver uma profunda situação vexatória. É um aborrecimento ser barrado, mas não é uma situação vexatória. Há distinção entre as duas coisas."

O motorista Ednaldo Barbosa, de 49 anos, submeteu-se em 2006 a uma cirurgia para colocar pinos de titânio na coluna, substitutos para vértebras desgastadas. Aposentado, ele foi à agência da Caixa Econômica Federal em agosto de 2008 para pagar contas.

"Cada vez que eu tentava entrar, a porta dava um tranco que sacudia todo o meu corpo. Estava com capacete e chaves na mão. Coloquei tudo no chão, mas não adiantou." Ednaldo chamou a polícia, que, de acordo com ele, também foi impedida de entrar. "Eram dois sargentos e dois soldados. Eles ficaram indignados e fomos para a delegacia", afirma. "Eu fiquei muito constrangido. Tinha uma fila enorme e todo mundo ficou me olhando. Levantei a camisa para mostrar a cirurgia e eles disseram que não interessa. Chamei o gerente, mas ele não veio", afirmou.

O processo movido por Ednaldo começou na 3ª Vara Cível de Mauá, mas o juiz decidiu transferir o caso para a Justiça Federal, uma vez que a Caixa Econômica integra a estrutura do governo federal. As advogadas Marlei Colaço e Solange Siben aguardam a citação da CEF. O pedido de indenização por danos morais não estipula valores e Ednaldo é beneficiário da Justiça gratuita. "A gente sabe que sempre é decidido muito menos do que é reivindicado", afirma a advogada. A Caixa Econômica Federal informou ao G1 que ainda não foi citada pela Justiça Federal.

Publicidade