Agressão
Denúncia aponta a existência do grupo de repressão "Choquinho"
O relatório do Conselho Penitenciário do Paraná também compilou uma série de denúncias contra um grupo chamado Seção de Operações Espaciais (SOE), conhecido no ambiente prisional como "Choquinho". A exemplo de unidades de elite da polícia, seus agentes vestem preto e usam capuz. A eles é atribuída uma série de acusações de tortura, com armas não letais. O documento foi encaminhado ao Ministério Público e à Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa.
"Têm eles [os agentes] cometido espancamentos, se utilizando de choques elétricos e queimaduras de cigarro, com o intuito de constranger alguém, com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico e mental", consta no relatório. Em um dos depoimentos, um detento disse que o "Choquinho" entra no presídio "a qualquer hora do dia ou da noite para bater nos presos".
O grupo foi criado para conter conflitos moderados nos presídios e conta com cerca de 50 agentes, treinados pela Polícia Militar (PM). O diretor do Depen-PR, Cezinando Paredes, nega que tenha havido tortura. "Para você ter uma ideia, nesses seis meses de atuação, eles usaram apenas duas bombas de contenção, de efeito moral. Só a presença deles já resolve o problema e dá apoio aos agentes penitenciários, para atuarem dentro das unidades penais", disse.
Comida com vidro
Conselho reúne relatos de detentos que comparam presídios a masmorras
Além do fechamento dos postos de trabalho, o Conselho Penitenciário do Paraná compilou denúncias graves, que ajudam a entender porque os presídios são comparados a masmorras. Os relatos apontam comida estragada, falta de produtos básicos de higiene, infestação por ratos e torturas sistemáticas. Além disso, os presos não têm tido acesso a defensores públicos e enfrentado dificuldades em audiências. "Nóis num qué piscina, churrasco. Nóis qué sabonete, comida sem cheiro, visita, café com açúcar e carne sem gosma (sic)", relatou um detento aos conselheiros.
A reclamação reiterada em relação à alimentação chamou a atenção do Conselho. Além da qualidade da comida, o grupo recebeu denúncias de que alguns presos teriam recebido marmitas com vidro moído escondido entre os alimentos. "Por diversas vezes, acabavam por ter hemorragia estomacal e, transferidos ao Complexo Médico Penal", diz o texto. Por causa das denúncias, a vistoria recomendou a abertura de sindicâncias e a criação de uma comissão que fiscalize a comida servida aos presos.
Segundo o coordenador do Departamento Penitenciário do Paraná (Depen-PR), Cezinando Paredes, a comissão já foi criada e analisa diariamente a qualidade da alimentação e se o cardápio feito pela nutricionista está sendo respeitado pela empresa que fornece as marmitas. O órgão garantiu ainda estar apurando denúncias relacionadas ao vidro moído na comida.
"Quando acontece a situação, já são separadas essas marmitex, exatamente para comprovar se realmente houve essa irregularidade ou não. Então estamos sendo bastante exigentes nesse sentido. Todas as denúncias são apuradas."
Higiene
O Conselho também apurou que o Estado não tem conseguido fornecer aos presos materiais básicos de higiene, como sabonetes, creme dental e papel higiênico. "Foi afirmado que o fornecimento desses materiais tem se dado quinzenalmente, quando por vezes, em prazo maior, o que não é suficiente", observa o relatório. Os familiares dos detentos têm recebido listas com os produtos que devem comprar para os internos. Apesar disso, há denúncias de que esses itens têm sido desviados dentro dos presídios. Paredes e a Seju confirmaram que houve problemas na licitação de compra e na entrega dos "kits de higiene", o que ocasionou um atraso em todo o Paraná. Os procedimentos teriam sido equacionados e as entregas começaram a ser feitas na semana passada.
48 agentes penitenciários serão nomeados nos próximos meses pela Secretaria de Estado da Justiça, totalizando 423 neste ano. Projeto que prevê a criação de 2,5 mil vagas será encaminhado à Assembleia Legislativa.
Os dois principais presídios estaduais de regime fechado do Paraná a Penitenciária Central do Estado (PCE) e a Penitenciária Estadual de Piraquara I (PEP-I) fecharam nos últimos 12 meses mais de 40% dos postos de trabalhos voltados aos detentos. Hoje, as duas unidades penais somam 2,2 mil presos, dos quais 233 trabalham o equivalente a 10,5% dos internos. O índice está abaixo da média nacional. No Brasil, 19,8% da massa carcerária trabalha no período em que está atrás das grades.
INFOGRÁFICO: Conselho Penitenciário do Paraná compilou outras denúncias nas duas unidades
O encolhimento das vagas de trabalho na PCE e na PEP-I foi constatado em vistorias feitas pelo Conselho Penitenciário do Paraná. "Resta evidente que as condições de trabalho e estudo [em ambos os presídios] estão se deteriorando a olhos vistos, com perdas irremediáveis", constatou o Conselho.
Juntas, as duas penitenciárias estaduais mantêm 11% dos detentos do Paraná. A PCE é a maior unidade em número de vagas: são 1.568 internos. Já a PEP-I se destaca por ser a prisão que concentra os membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Outras unidades penais do estado ainda serão vistoriadas.
Corte pela metade
O corte mais acentuado dos postos de trabalho para presos foi diagnosticado na PCE. Em um ano, mais da metade das vagas foram fechadas. Hoje, 141 apenados trabalham na unidade: 9% dos internos. Das sete empresas que mantinham convênio para oferecer trabalho aos detentos, apenas duas permanecem.
Na PEP-I, o número de postos caiu de 106 para 92, o que dá oportunidade a apenas 14,3% dos presos trabalharem. Nos últimos 12 meses, um dos dois canteiros fechou: só a empresa que fornece alimentação aos internos continua em atividade.
O trabalho de presos em presídios é visto como um dos pilares da ressocialização, já que dá ao detento a oportunidade de se aprofundar em um ofício, ao mesmo tempo que recebe por isso (a remuneração varia entre R$ 140 a R$ 543, por mês). A Lei de Execuções Penais atribui como um dever do Estado a oferta de condições para que os internos trabalhem. Além disso, os dias trabalhados contam para reduzir parte da pena.
"Observamos a crônica de uma morte anunciada. Isso é reflexo de um processo de deterioração acelerada do sistema prisional", definiu o deputado Tadeu Veneri (PT), que preside a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, a quem o relatório de vistoria dos presídios foi encaminhado. "Os presos estão ganhando até um quarto de um salário mínimo. É ilegal", completou.
"As ações para reverter este quadro já foram iniciaas", informou a Secretaria de Estado da Justiça (Seju) por meio de nota. A pasta pôs em andamento um edital de chamada para credenciar empresas interessadas em usar mão de obra prisional. A secretaria acrescenta que o índice de presos trabalhando (que chegou a 29,6% no início do ano) agora corresponde a 24,4% da massa carcerária do estado, o que ainda faz do Paraná o estado com maior porcentual de detentos empregados.
Falta de agentes fez convênios serem encerrados
O relatório do Conselho Penitenciário do Paraná estabelece uma relação direta entre o fechamento dos postos de trabalho na PCE e na PEP-I e a defasagem do número de agentes penitenciários. De acordo com a vistoria, a falta de servidores para fazer a "movimentação" (condução dos internos aos canteiros de trabalho) gera "insegurança na produção e, por consequência, prejuízo às empresas".
"É inadmissível que [os canteiros] se encontrem desativados, mantendo os presos no ócio, o que contribui diretamente com os problemas de segurança e disciplina que a unidade penitenciária tem sofrido", diz o relatório. O Conselho recomendou às autoridades judiciárias o aumento do número de agentes lotados nas duas unidades.
"O tratamento penal da PCE e da PEP-I sofrem com a falta de agentes. Além do trabalho, a escola não tem sido desenvolvida nas unidades por causa disso. Precisaríamos aumentar em um terço o número de agentes no estado", disse o vice-presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná, Antony Johnson.
Por meio de nota, a Secretaria de Estado da Justiça confirmou que o desligamento do convênio de três das empresas que ofereciam vagas de trabalho na PCE ocorreu por "problemas" causados por parte de um grupo de agentes. Isso "propiciou atraso na entrega das mercadorias das empresas instaladas na unidade".
A secretaria acrescentou que, nos próximos meses, 48 agentes penitenciários serão nomeados, somando 423 nomeações neste ano. Um projeto que prevê a criação de 2,5 mil vagas para agentes deve ser encaminhado à Assembleia Legislativa nos próximos meses. Enquanto a proposta não sai do papel, a Seju vai realizar um Processo Seletivo Simplificado para contratar em caráter emergencial agentes para suprir o déficit.
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