O médico Daniel Merlin Palhares, deficiente visual, não conseguiu garantir que o processo seletivo para residência médica no Hospital de Clínicas (HC) reservasse uma vaga para candidatos com necessidades especiais. Palhares queria ingressar na residência de Psiquiatria, sob a justificativa de que nesta área sua deficiência, a baixa visão nos dois olhos, não atrapalharia a atuação profissional. O médico, que também é especialista em medicina do trabalho, é formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
O concurso oferta apenas vagas destinadas à ampla concorrência, isso é, sem nenhuma espécie de cota. Na Justiça, Palhares pleiteou a reserva, argumentando que ela está presente em outros concursos e, para ele, seria justo, portanto, que também existisse nos processos seletivos para pós-graduação. Em primeira instância, venceu e uma liminar obrigou que o hospital universitário reservasse uma vaga ao candidato.
Mas após a divulgação do resultado final, em dezembro de 2015, a Comissão de Residência Médica do HC (Coreme), que é subordinada da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), do Ministério da Educação (MEC), resolveu recorrer da decisão, que foi reformada e desobrigou o hospital a matricular Palhares.
De acordo com a assessoria do HC, o recurso foi embasado no fato de que não há previsão legal que obrigue a instituição a garantir vagas para candidatos com deficiência. O hospital, por meio da assessoria, informou ainda que o médico não atingiu a nota necessária para ingressar na especialização. O processo de matrículas foi encerrado nesta terça-feira (26), às 17h.
Ao contrário do que ocorre com as cotas raciais, ainda não existe lei federal que obrigue as instituições de nível superior a reservar vagas para pessoas com necessidades especiais em seus vestibulares, embora muitas já o façam. A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, também chamada de Estatuto da Pessoa com Deficiência, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 2015, previa, no artigo 29, a reserva de cotas para pessoas com necessidades especiais nos vestibulares. O dispositivo, porém, foi vetado.
Para Palhares, a justificativa de falta de previsão legal não é suficiente. “A legislação tem que preceder o bom senso e a ética?”, argumentou. Já advogada do médico, Rosângela Wolff Moro, citou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da qual o Brasil é signatário e está em vigor no país desde 2009, com força de emenda constitucional, e que tem como uma de suas previsões a criação, pelos Estados Partes, de políticas inclusivas. Para Rosângela, portanto, “a falta de uma legislação específica não deveria servir de ‘escudo’ para o descumprimento de uma convenção internacional”.
Colaborou: Mariana Balan
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