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Mapeamentos

Capela é mirante do ciclo da erva-mate

O descendente

O administrador Fernando Fontana, 77 anos, bem se lembra. Ainda na década de 1960, um dos primos, da família Veiga, ligava para que juntos fizessem pequenos restauros na Capela da Glória. Era rotina. A tia Dolores Veiga de Leão – filha da Maria Dolores Leão Fontana – herdara da mãe e idealizadora do pequeno templo as responsabilidades no trato do prédio. Com o passar dos anos, esses cuidados foram ficando para o passado.

Mas nada que impedisse o ressentimento – Leões, Veigas e Fontanas expressaram aqui e ali um certo rancor com a lentidão da Mitra e da Prefeitura Municipal em garantir a integridade da Capela da Glória. Agora, tudo ficou mais caro e a cidade privada de uma de suas arquiteturas mais curiosas – a capela familiar do Alto da Glória.

Fernando descreve em minúcias os fatos que deram origem à capela. Começa pela amizade do Barão do Serro Azul com o exportador ítalo-uruguaio Francisco Fasce Fontana, travada no Uruguai. A vinda de Fontana para Curitiba – já homem maduro para a época, com 33 anos – resultou no casamento com Maria Dolores Leão, 19 anos, filha do desembargador Agostinho Ermelino de Leão, em setembro de 1882. Ficaram juntos até 1894 – 12 anos e um filho, Francisco Fido Fontana. O erguimento da Capela de Nossa Senhora da Glória, em etapas, de 1895 a 1897, se deu em função dessa morte,

As informações são difusas. O comendador Francisco Fasce Fontana tinha fortes dores de cabeça, convulsões. A esposa religiosa teria desejado um templo para lhe render memória. Em seguida, num agradecimento por seu segundo marido, o mineiro Bernardo Veiga, ter salvo da família da falência. O que se sabe com certeza é que a capelinha passou a fazer parte das lides de Dolores e, depois, de sua filha do mesmo nome, de apelido Lolita, mulher do empresário Ivo Leão, do portentoso Matte Leão.

Não faltavam fieis nas missas rezadas na capelinha. Somente os empregados das três famílias ligadas ao templo, mais os vizinhos de outras mansões, por boas décadas ocupavam todos os lugares. Foi assim até 1960, quando os redentoristas assumiram o local. "Havia muitos descentes de poloneses e ucranianos, religiosos como se sabe", comenda Fernando Fontana, diante da caixa de fotografias e mapas em que guarda informações sobre o Alto da Glória. A capelinha pode não ser o capítulo mais importante dessa história – que envolve o poder da erva-mate e a vida privada dos capitalistas de então -, mas é com folga uma das mais cativantes.

A arquiteta

"Comecei do zero", diz a arquiteta e restaurador Aline Soczek Bandil, ao se referir ao projeto da Capela Nossa Senhora da Glória – exemplar neoclássico plantado em 700 metros de terreno no Alto da Glória. Os estudos e orçamentos feitos em 2007 – ano da primeira incursão da Mitra pelo local – simplesmente goraram. Nenhum valor equivale mais ao previsto, um percalço do mercado de conservação e restauro no Brasil: os preços mudam na velocidade inversa da passagem dos séculos.

A arquiteta ainda não tem previsão sobre quando vai entregar a nova papelada – mas não deve demorar. Com o cobertor curto do orçamento, a expectativa é não ultrapassar R$ 1 milhão, pois R$ 900 mil já foram captados em anos anteriores, evitando que a Cúria tenha de captar dinheiro no mercado imobiliário, num momento recessivo.

Se tudo correr como o previsto, a capela voltará a ter telhas de barro, tal e qual no final do século 19. E pinturas nas paredes internas, embora seja essa a grande incógnita. A suspeita da restauradora é que não existam decorações encobertas por tintas, em demãos ao longo do tempo, mas somente um minucioso trabalho de decapagem poderá provar. Em caso de haver elementos escondidos, tudo deve ser revelado e o preço do restauro dará um salto. "Suspeito que possa haver pintura de molde, comum na primeira metade do século", diz Aline.

A cobertura do presbitério é outro mistério. Em fotos antigas, aparece em azul, com pinturas de anjos. Hoje está recoberto de branco, com madeiramento irregular. Provavelmente foi retirado, em más condições. Mas em matéria de restauro tudo pode acontecer. Os pequenos tesouros da Capela da Glória vêm à tona a cada vez que uma espátula roça as paredes. "É um quebra-cabeça".

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