O ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho enfrentará júri popular pela acusação de ter matado dois jovens em um acidente de trânsito em 2009, em Curitiba. Em decisão unânime, a 1.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) encontrou mais uma vez indícios de que Carli Filho assumiu o risco de matar ao dirigir em alta velocidade e depois de ingerir bebida alcoólica.
A defesa conseguiu, com recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que o caso fosse novamente julgado. Há ainda possibilidade de recursos e o advogado de defesa do ex-parlamentar, René Dotti, informou que vai novamente ao STJ para tentar reverter a derrota no tribunal local.
Os advogados das famílias de Gilmar de Souza Yared e de Carlos Murilo de Almeida vítimas do acidente esperam que agora o juiz da 2.º Vara do Júri de Curitiba, Daniel Surdi de Avelar, possa enfim marcar a data do julgamento. "Entendemos que não há efeito suspensivo", afirma o advogado da família Yared, Elias Mattar Assad.
Acusação e defesa
Marcado para as 13h30, o início do julgamento atrasou apenas cinco minutos, mas começou de forma tensa. Na plateia, familiares das vítimas e os advogados de defesa do ex-deputado ficaram sentados perto uns dos outros, enquanto os assistentes de acusação Assad e Juarez Xavier Küster argumentaram pela manutenção do júri popular durante vinte minutos.
Na avaliação dos dois, as provas que existem dentro do processo comprovam que Carli Filho não se preocupou com o risco de dirigir em alta velocidade após ter bebido. "Qualquer cidadão médio tem a compreensão de que ele [Carli Filho] tinha consciência e consentiu com o resultado de morte", afirmou Küster.
Com o mesmo tempo da acusação, Dotti e o advogado Roberto Brzezinski Neto tentaram mostrar que Carli Filho tinha a preferencial na rua em que estava e, por isso, não precisaria ter cautela. No cruzamento da Rua Paulo Gorski (por onde trafegava o carro das vítimas), com a rápida Ivo Zanlorenzi (por onde passava o ex-deputado), a preferencial era de Carli Filho, argumento desconsiderado pelos desembargadores.
"Existe uma regra de trânsito naquele cruzamento, sim ou não? Era possível quem dirigia o Honda Fit (carro em que estavam as vítimas) ver o carro vindo", questionou Brzezinski. Ele ainda lembrou que a alta velocidade não poderia ser comprovada, uma vez que velocímetro estava zerado no momento da perícia.
Votos
O relator do caso, desembargador Telmo Cherem, ao ler sua decisão, aceitou o pedido da defesa que queria a retirada do teste de alcoolemia dentre as provas do processo. O exame, que teria registrado 7,8 decigramas de álcool por litro de sangue do ex-deputado, foi feito no hospital, enquanto Carli Filho estava desacordado. Como não consentiu com o teste, ele estaria desobrigado, pela lei, a conceder prova contra si próprio. Segundo Cherem, é o primeiro caso no estado de afastamento do teste de alcoolemia, portanto, será um precedente importante para outros julgamentos futuros.
No caso do homicídio doloso eventual, Cherem, o desembargador Jonny de Jesus Campos Marques e o juiz substituto de 2.º Grau Benjamim Acácio de Moura, entenderam que não era possível as vítimas verem Carli Filho se aproximando do cruzamento. Eles contaram que foram ao local do acidente, para ver com os próprios olhos, as condições de trânsito no ponto da batida. A partir de vários fatores, como velocidade e embriaguez, os magistrados decidiram que há elementos suficientes para indicar dolo eventual do acusado.
"Há ainda muito pela frente", diz mãe de vítima
O primeiro andar do prédio anexo ao Tribunal de Justiça do Paraná ficou lotado de pessoas que queriam saber se o ex-deputado Luiz Fernando Ribas Carli Filho iria a júri popular. Por volta das 13 horas, curiosos, estudantes e jornalistas se amontoavam em frente da sala de audiência da 1.ª Câmara Criminal. O primeiro da fila era o advogado de defesa René Dotti, que por mais de meia hora aguardou em pé, pacientemente, a abertura da porta. As pessoas que não conseguiram um espaço na sala de audiência acompanharam o julgamento por um telão colocado no saguão de entrada.
O desembargador Telmo Cherem, relator do processo, reforçou que, naquele momento, não estava sendo decidido se Carli Filho deveria ser condenado ou absolvido apenas se havia indícios suficientes para levar o caso a júri popular. A sessão durou pouco menos de duas horas. A decisão de levar Carli Filho a júri popular provocou reações contidas. Cristiane Yared, mãe de uma das vítimas, foi abraçada por amigos e desconhecidos. "Essa é a Justiça que aprendi a amar com o meu pai que foi desembargador. Há ainda muito pela frente e não há vencedores nesse caso, mas acredito que se fez justiça", disse. Segundo Dotti, Carli Filho e família acompanharam, a distância, o desenrolar do julgamento.
Defesa
Para Dotti, a demora no julgamento ontem e o longo voto do relator revelam a complexidade do caso e mostram que existem dúvidas sobre como o acidente aconteceu. Ele argumenta que os tribunais entendem que excesso de velocidade e embriaguez não são suficientes para caracterizar o dolo (quando a pessoa assume o risco de matar ou provocar dano). Para o advogado Roberto Brzezinski Neto, também da defesa, é preciso considerar que se não houvesse a manobra [a invasão da preferencial pelas vítimas], não haveria o acidente. Ele acredita que a questão principal não foi analisada de que havia visibilidade [para perceber a aproximação do carro de Carli Filho] e de que a preferencial foi desrespeitada.
René Dotti argumenta que a cobertura da imprensa interfere no caso. Ele também afirma que Carli Filho sofreu consequências, como a perda do mandato de deputado estadual e sequelas do acidente, e que era uma pessoa calma, sem registro anterior de violência.
Opinião
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