Desde que ingressou no Supremo Tribunal Federal, em 2006, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha tem agido como típica mineira: discreta, tranquila, evita polêmicas e confrontos com os colegas. Nos últimos meses, porém, alguns dos votos proferidos em plenário e dos discursos para diferentes plateias indicam que ela pode assumir uma postura bem aguerrida na presidência da Corte, que assumirá a partir de setembro.

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No fim de novembro, quando a Segunda Turma do STF referendou a prisão preventiva do senador Delcídio do Amaral, decidida na véspera pelo ministro Teori Zavascki, o voto mais contundente foi de Cármen Lúcia. “Na história recente da nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós, brasileiros, acreditou no mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a Ação Penal 470 [do mensalão] e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo”, afirmou, causando a ira de alguns movimentos de esquerda.

A verve de Cármen Lúcia, entretanto, não é direcionada a um partido específico. Em agosto de 2015, quando a oposição da presidente Dilma Rousseff tentava insuflar o processo de impeachment, a ministra disse, em um evento: “É um instituto que está previsto na Constituição, só que aplica-se em casos de processo de crime de responsabilidade, e não tem nada disso em andamento”. Na mesma ocasião, citou uma frase de Benjamin Disraeli, primeiro-ministro do Reino Unido: os homens de bem precisam ter a ousadia dos canalhas. Posteriormente, ao jornal Estado de Minas, ela reforçou que as pessoas precisam reagir para mudar a situação, e não deixar o mal prevalecer.

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Cármen Lúcia foi advogada, promotora e ocupava o cargo de procuradora-geral de Minas Gerais quando foi indicada pelo então presidente Lula ao STF. Na sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, foi aprovada por unanimidade. Na votação secreta em plenário, dos 56 presentes, apenas um ficou contra a indicação – o melhor desempenho entre todos os 13 ministros que assumiram desde 2003. Mesmo assim, a mineira sempre foi integrou a ala mais “combativa” do STF, que pende para a aplicação de penas mais rígidas (inclusive para políticos) e respostas mais rápidas para as demandas da sociedade.

Um exemplo de resposta mais rápida veio há poucas semanas, na sessão histórica de 17 de fevereiro, quando o STF modificou a jurisprudência e decidiu, por sete votos a quatro, que a pena já pode ser cumprida após decisão de segunda instância. O resultado, aliás, teve um gosto especial para Cármen Lúcia. Em 2009, quando o órgão havia declarado que a sentença só poderia ser executada após trânsito em julgado, ela foi voto vencido, junto com outros três. Agora, com nova composição e mudança de voto de Gilmar Mendes, ficou do lado vencedor.

Do grupo que perdeu a votação há sete anos, ela é a única remanescente na Suprema Corte: Joaquim Barbosa e Ellen Gracie se aposentaram, e Menezes Direito morreu ainda em 2009. Na sessão recente, Cármen Lúcia voltou a ressaltar que a condenação em segunda instância deve ser respeitada, e que ela é diferente da culpa definida apenas após o trânsito em julgado.

Mas a artilharia da mineira vai para vários lados. Em junho de 2015, ganhou respeito entre os defensores da liberdade de expressão, ao rechaçar a possibilidade de censura prévia a biografias. “Cala a boca já morreu, quem manda aqui sou eu”, disse ela, ao resumir seu voto como relatora da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.815.

Cármen Lúcia também alveja a própria corporação. Em novembro, criticou os “penduricalhos” recebidos por membros do Judiciário e do Ministério Público. “Indenização é deixar indene, sem dano. Se não houve dano, não há que se falar em indenização, por óbvio. Aí é português. E, no entanto, sob o nome de verba indenizatória se paga o que não deve”.

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perfil

Cármen Lúcia Antunes Rocha nasceu em Montes Claros (MG) em 14 de abril de 1954. É formada em Direito pela PUC-MG, mestre em Direito Constitucional pela UFMG e doutora em Direito do Estado pela USP. Foi procuradora-geral do Estado de Minas Gerais no governo de Itamar Franco.