Quando o médico erra
A professora Ilma Luciane Dias Proença, 30 anos, diz que quase perdeu a vida após fazer uma cirurgia de estômago há quatro anos. Ela acusa o profissional que fez a operação por erro médico. "Nem registro de cirurgião o médico tinha. Ele me enganou", conta. Ilma lembra que ficou muito mal. "Perdi 20 quilos em três meses e quase morri". Ela denunciou o médico ao Conselho Regional de Medicina (CRM) na época, mas diz que se frustrou com o resultado do processo. "Não adiantou nada, ele continua atuando até hoje. Agora, estou com uma ação na Justiça para exigir meus direitos", afirma.
Infratores não são protegidos, garantem órgãos
De acordo com o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Paraná (Crea-PR), Álvaro Cabrini Junior, o fato de profissionais julgarem colegas de profissão não torna o processo mais brando. "O corporativismo que existia antigamente acabou. Hoje ninguém se conhece. Lutamos cada vez mais para que os defeitos e erros sejam punidos com severidade. Não queremos os maus profissionais, apenas os bons".
Pelo menos 704 profissionais de seis das maiores entidades de classe do Paraná receberam algum tipo de punição no ano passado por má conduta no exercício do trabalho. Desses, apenas 1% sofreu a pena mais severa: a cassação do registro profissional e o impedimento de exercer o ofício. Para especialistas, o baixo número de cassações é consequência do corporativismo. Juntas, as seis entidades somam quase 154 mil profissionais ativos no estado. São elas: a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR) e os conselhos regionais de Odontologia (CRO-PR), Contabilidade (CRC-PR), Medicina (CRM-PR); Farmácia (CRF-PR) e Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea-PR).
Na maioria dos casos, a punição é uma advertência confidencial em aviso reservado, ou seja, apenas o profissional fica sabendo. Em segundo lugar vem a censura pública, quando o nome do profissional e o artigo do Código de Ética que ele infringiu são divulgados em veículos de comunicação. Em alguns conselhos, como o de Farmácia e o de Contabilidade, também são aplicadas multas. "A cassação é o último recurso. Ela só é utilizada quando o conselho de profissionais acredita que aquele profissional não tem mais correção", afirma o corregedor-geral do CRM-PR, Alceu Fontana Pacheco.
Um dos dados divulgados pelos conselhos que mais chamam a atenção é o de absolvições. Nos últimos cinco anos, as entidades absolveram cerca de 2 mil profissionais. Os números que mais evidenciam isso foram registrados pelo Conselho Regional de Medicina. De 2005 para cá, 296 médicos foram absolvidos. Outros 171 foram punidos e apenas cinco tiveram o registro cassado.
Para o sociólogo Ricardo Costa de Oliveira, chefe do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Paraná (UFPR), toda categoria profissional tem um viés corporativo. "Até que se prove o contrário, as entidades sempre vão proteger os seus profissionais. Os maus profissionais só são efetivamente punidos quando existe uma forte pressão da opinião pública", afirma.
Para o professor, quanto mais a sociedade fiscalizar, menor é a chance de o corporativismo se perpetuar. "A sociedade e a imprensa têm que fiscalizar. Mais fiscalização significa mais transparência sobre as decisões dos conselhos profissionais", opina.
Denúncias
Apesar de muitas sindicâncias nascerem de denúncias feitas pela sociedade, a maioria dos casos é constatada a partir de uma investigação interna. Nos conselhos de Contabilidade, Farmácia e Engenharia, por exemplo, menos de 10% das sindicâncias foram abertas a partir de reclamações da população. Segundo o presidente do Crea-PR, Álvaro Cabrini Junior, a maior parte das irregularidades é constatada por outros profissionais ou pelos fiscais do conselho. "São poucas as denúncias de clientes", diz.
Segundo os dados levantados pela Gazeta do Povo, grande parte das reclamações feitas pela população paranaense contra arquitetos, engenheiros, médicos, dentistas, advogados, farmacêuticos e contabilistas são por incapacidade técnica e falta de zelo no desempenho das suas funções profissionais. Outras denúncias, mas formuladas por fiscais e colegas de profissão, são a publicidade irregular e o roubo de clientela.
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