O jornalista Breno Altman relativizou a gravidade dos atos terroristas do Hamas.| Foto: Reprodução/YouTube
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Nos últimos meses, a Confederação Israelita do Brasil (Conib) entrou com uma série de ações na Justiça contra o jornalista Breno Altman, que tem feito críticas duras à postura do Estado de Israel no atual conflito no Oriente Médio, chegando a relativizar a gravidade das ações do Hamas. Altman teve algumas de suas postagens nas redes censuradas. Ele também é alvo de um pedido de suspensão dos seus perfis.

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Entre as frases recentes de Altman que causaram controvérsia, estão algumas como:

  • "Podemos não gostar do Hamas, discordando de suas políticas e métodos. Mas essa organização é parte decisiva da resistência palestina contra o Estado colonial de Israel. Relembrando o ditado chinês, nesse momento não importa a cor dos gatos, desde que cacem ratos."
  • "O Estado colonial e racista de Israel deve ser submetido a boicote, desinvestimento e sanções, como a África do Sul durante o apartheid."
  • "Os sionistas brasileiros xingam e ameaçam. Mas são profundamente medrosos e covardes, valentões de internet. Conheço essa gente desde a infância."
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Juristas consultados pela Gazeta do Povo consideram que a censura aos conteúdos do jornalista fere o direito constitucional à liberdade de expressão. Para eles, embora tenha usado linguagem agressiva e hostil contra o Estado de Israel e feito vista grossa para o grupo terrorista Hamas, Altman não praticou racismo, como sugeriram tanto as ações da Conib como a justificativa do desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) responsável pelas decisões de censura.

Alessandro Chiarottino, doutor em Direito Constitucional pela USP, destaca a importância de diferenciar o racismo, incluindo o antissemitismo, de críticas a ideologias políticas. Ele argumenta que, embora as falas de Altman contra Israel possam ser consideradas equivocadas e até agressivas, não necessariamente caracterizam racismo ou antissemitismo.

"Tomar uma posição contra o Estado de Israel não necessariamente é antissemitismo", diz. "Na legislação do Brasil, existe uma concepção segundo a qual o racismo – e aí a gente inclui o antissemitismo – é considerado crime e, portanto, não entraria na liberdade de expressão. Agora, para que se caracterize realmente o antissemitismo, deve haver ataques ao povo judeu como um todo, sejam verbais, por escrito ou físicos."

O tuíte mais polêmico de Altman, alvo de uma das decisões de censura, termina com uma frase que causou controvérsia: "Relembrando o ditado chinês, nesse momento não importa a cor dos gatos, desde que cacem ratos", afirmou. Usuários da rede social X o acusaram de usar "ratos" em referência aos judeus.

A frase é comumente atribuída a Deng Xiaoping, líder reformista da China, que a usou para simbolizar sua abordagem pragmática às políticas econômicas no final do século 20. Deng defendia que, independentemente dos métodos, o importante era alcançar o objetivo desejado. "A fala dele [de Altman], por mais equivocada que possa ser, não caracteriza racismo. E tampouco ele comparou os judeus a ratos", diz Chiarottino.

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O advogado constitucionalista André Marsiglia, especialista em liberdade de expressão, ressalta que a exclusão de manifestações deve ser sempre a última alternativa da Justiça. Ele defende que opiniões, por sua natureza subjetiva, não devem ser censuradas, mas sim confrontadas por meio de diálogo ou, em casos de excesso aos limites da lei, sancionadas com indenizações.

Marsiglia critica a iniciativa de tentar gerenciar judicialmente a opinião alheia. "Primeiro, é um conteúdo opinativo. Não temos como dizer se isso é verdade ou é mentira, porque existe a subjetividade por trás da opinião dele. Segundo, existem outras formas de se punir caso ele tenha se excedido, como punições indenizatórias. A exclusão como punição, nesse caso, me parece dialogar com uma intenção censória", comenta.

Na semana passada, o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão colegiado composto por diversas ONGs e vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), publicou nota em defesa de Breno Altman. O órgão afirmou que a Conib "tenta calar" Altman e que vê "com muita preocupação a escalada de censura a jornalistas e comunicadores e a utilização de mecanismos jurídicos para coibir a livre manifestação de opinião".

"Discurso de ódio" é citado como motivo para censura

Na primeira decisão de censura a Altman, em 22 de dezembro do ano passado, o desembargador Salles Vieira, da 2ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, pediu a retirada de "toda e qualquer postagem que contenha, ainda que minimamente, discurso de ódio, xenofobia, antissemitismo e antissionismo". Para os juristas consultados pela reportagem, a decisão é vaga, e o desembargador se equivoca ao citar "discurso de ódio" como um tipo penal.

"O discurso de ódio não é um crime tipificado em lugar nenhum da nossa legislação. E, além disso, existe uma subjetividade imensa nessa determinação judicial. Uma das formas de você evitar censura na exclusão de um conteúdo é justamente ser objetivo", diz Marsiglia.

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Para Chiarottino, o sistema jurídico brasileiro garante a prerrogativa do cidadão de externalizar o seu ódio. "Nós temos limites para isso, que são dados pela Constituição e pela nossa jurisprudência, e o limite é a prática do crime de racismo. Se alguém entra na rede social e começa a difundir que uma determinada etnia é intrinsecamente ruim, que não merece os direitos que outros merecem, que merece ser atacada, aí, sim, há uma caracterização de racismo. Agora, criticar o Estado de Israel, dizer que tal política é opressiva, que estão praticando discriminação contra a população palestina… Dizer isso não é racismo."

Marsiglia destaca a importância de um Judiciário capaz de agir sem politizar os assuntos e se atendo aos princípios. "A politização dos conteúdos infelizmente contamina a principiologia a respeito da liberdade de expressão no debate do país", diz.

Para o jurista, a falta de coerência é um dos grandes empecilhos para a defesa da liberdade de expressão no país. "A liberdade de expressão que vale passa a ser a liberdade de expressão minha e dos meus. Se alguém discorda de mim, para ele vale outro tipo de referência a respeito da liberdade de expressão."

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]