O procurador de Justiça Cid Vasques deixou ontem o comando da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná (Sesp). A diretora-geral da pasta, Thathyana Assad, também pediu a exoneração. O substituto de Vasques será o terceiro titular da Sesp em três anos e quase dois meses do governo Beto Richa. Até o fechamento desta edição, o nome do novo secretário não havia sido anunciado. Por enquanto, o chefe de gabinete da Sesp, Walter Gonçalves assume interinamente a pasta.
"Setores do Ministério Público, instituição a que pertenço, na qual devotei e devoto importante parcela de minha existência, entenderam por bem obstaculizar a minha manutenção na direção da segurança pública", afirmou Vasques, por meio de nota. A frase marca uma das crises mais fortes pela qual o procurador passou no comando da Segurança Pública do Paraná.
O agora ex-secretário travou, de setembro do ano passado a janeiro deste ano, uma disputa intensa para implantar o rodízio de policiais no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do Ministério Público Estadual (MP-PR). O próprio MP tentou impedir a renovação da licença de Vasques para atuar no Executivo, caso que foi parar até no Supremo Tribunal Federal (STF). No começo deste mês, o governador Beto Richa chamou para si a decisão e cancelou o rodízio de policiais no Gaeco.
"Eu não fui escanteado da decisão. O governador ponderou todas as opiniões que se tem a respeito disso e deve baixar um novo ato regulamentando a atividade. Porque o que existia até então estava dando margem a controvérsias de interpretação", disse Vasques, na época.
Por outro lado, apesar das crises enfrentadas (veja box abaixo), Vasques conseguiu um objetivo importante para o estado. O Paraná encerrou 2013 com uma queda acentuada de 18% no número de homicídios dolosos foi a segunda queda em três anos. Ano passado, foram 2.575 homicídios em todo estado, contra 3.135 em 2012.
Nome forte
Coincidentemente, um dia antes do anúncio de sua saída, na segunda-feira, Vasques esteve reunido com a secretária de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju) do Paraná, Maria Tereza Uille Gomes. Após o encontro, Maria Tereza saiu em viagem para tratar de assuntos particulares e deve retornar à capital na sexta-feira. Nos bastidores do governo estadual, há quem inclusive fale que a secretária é um nome forte para assumir o comando da Sesp.
Delegado-geral deixará o cargo à disposição
O delegado-geral da Polícia Civil, Riad Farhat, afirmou ontem que deve colocar o cargo à disposição assim que o novo secretário for anunciado. Ele lamentou a saída do procurador Cid Vasques da titularidade da pasta da Segurança Pública. "Lamento muito porque a equipe estava engrenada", disse, em entrevista por telefone.
Segundo Farhat, o seu nome foi escolhido por Vasques. "Meu cargo é de confiança e quem escolhe é o secretário da Segurança. Vou deixar o próximo secretário à vontade", disse. A reportagem tentou localizar o comandante-geral da Polícia Militar, coronel César Kogut, sem sucesso.
Michelotto
A saída de Cid Vasques coincidiu também com o pedido do ex-delegado-geral Marcus Vinicius da Costa Michelotto para deixar o Conselho da Polícia Civil e a Divisão de Polícia Especializada. De acordo com Farhat, a saída dele ocorreu de forma tranquila. Porém, nos bastidores da Polícia Civil, segundo apuração da reportagem, o clima era conturbado devido à permanência de Michelotto no Conselho. Muitos policiais contestavam a presença do delegado em razão de ele ser alvo de investigação do Gaeco.
Histórico
Além da disputa com o Ministério Público, o agora ex-secretário Cid Vasques enfrentou outras crises durante os 17 meses que esteve à frente da pasta:
Operação Vortex
Em abril do ano passado, uma operação deflagrada pelo Gaeco apontou um esquema de corrupção articulado a partir da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos. Segundo as investigações, delegados e investigadores cobravam propina de donos de desmanches.
Crime Sem Castigo
A série de reportagens "Crime sem Castigo", da Gazeta do Povo, mostrou como a lentidão na investigação de assassinatos na capital paranaense leva à alta impunidade nos últimos 10 anos, apenas 4% dos acusados foram condenados.
Prisão de Michelotto
Em dezembro de 2013, o ex-delegado-geral Marcus Vinícius Michelotto foi preso, em uma operação do Gaeco, acusado de envolvimento em um esquema de exploração de jogos de azar.
Falta de dinheiro
No fim do ano passado, a falta de recursos do governo estadual atingiu a Sesp. Viaturas chegaram a parar de rodar, por falta de combustíveis. Também faltou dinheiro para a manutenção de batalhões da PM e de delegacias.
Colaborou Felippe Aníbal
"MANIFESTAÇÃO PÚBLICA
Ao assumir a Secretaria da Segurança Pública há um ano e meio, mais que aceitar um convite do Governador Beto Richa, concordei em cumprir uma missão: reduzir a criminalidade no Estado do Paraná.
Graças ao trabalho desempenhado por todos os servidores (policiais e civis) e com o apoio do Senhor Governador, alcançamos resultados surpreendentes nesse curto espaço de tempo: a redução no índice de homicídios em 18% no Estado, a aquisição de 1.220 viaturas, a incorporação de milhares de policiais para servir a população, além de gigantescas apreensões de drogas e armas. O trabalho foi realizado.
A segurança pública precisa prestigiar os servidores que se dedicam a salvar vidas. A boa polícia é a regra e os casos de corrupção, que são a EXCEÇÃO, devem ser combatidos com toda a energia.
Se hoje podemos comemorar as centenas de vidas que foram poupadas com a inacreditável redução dos homicídios em 18%, muito disso se deve ao reconhecimento do trabalho e da importância da polícia civil, militar, científica e dos bombeiros militares, que não pode e não deve ser comandada por nenhuma instituição que não o Estado do Paraná.
Setores do Ministério Público, instituição a que pertenço, na qual devotei e devoto importante parcela de minha existência, entenderam por bem obstaculizar a minha manutenção na direção da segurança pública.
Por entender que garantias constitucionais básicas estavam sendo agredidas, tive de bater às portas do Poder Judiciário. Obtive diversas decisões favoráveis, inclusive do Presidente do Supremo Tribunal Federal, Min. Joaquim Barbosa. As inúmeras decisões positivas, colhidas no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e, até mesmo, no STF, representam uma demonstração inquestionável de que algo estava errado na incansável tentativa de me afastar da SESP.
Neste percurso, o meu compromisso com o povo do Paraná e com o Governador Beto Richa, que me confiou uma missão, foi cuidadosamente cumprido.
Retorno ao Ministério Público, instituição na qual construí a minha carreira, para perseguir o interesse público num outro local e numa atividade diferente. Entreguei ao Governador e ao Estado do Paraná exatamente aquilo que outrora havia prometido. A minha luta sempre foi por convicções. O preço que se paga, por vezes, é alto. Mas a falta de coragem seria um preço alto demais. Esse preço, em hipótese alguma, estou disposto a pagar.
Luta árdua, consciência limpa. Deus sempre à frente.
CID MARCUS VASQUES"