Cientistas norte-americanos identificaram o gene responsável por determinar o sexo em mosquitos Aedes aegypti, transmissores dos vírus de doenças como dengue, chikungunya e febre amarela. De acordo com os autores do estudo, publicado na versão online da revista Science nesta quinta-feira (21), a descoberta é importante porque permite manipular o sexo dos mosquitos e converter as fêmeas em machos, reduzindo a transmissão das doenças. Os mosquitos macho são considerados inofensivos: apenas as fêmeas picam, porque precisam de sangue para nutrir seus ovos.
Diversas linhas de pesquisa voltadas para o combate ao mosquito da dengue, no Brasil e em outros países, utilizam a abordagem de reversão sexual dos mosquitos. Os autores do novo estudo esperam que a descoberta possa acelerar os avanços nesse tipo de estratégia.
A equipe coordenada por pesquisadores da Virginia Tech, nos Estados Unidos, identificou no Aedes aegypti um gene batizado de Nix, que funciona como um “interruptor” capaz de determinar se o mosquito será macho ou fêmea.
“O Nix nos fornece uma animadora oportunidade de interferir na determinação do sexo do mosquito, na luta contra essas doenças infecciosas, porque os machos não transmitem doenças”, disse um dos autores do estudo, Zhijian Jake Tu.
Injetando o Nix em embriões de mosquitos, os pesquisadores descobriram que mais de dois terços das fêmeas desenvolveram genitais masculinos e testículos. Quando eles removeram o Nix, utilizando um método de edição de genomas conhecido como CRISPR-Cas9, os mosquitos macho desenvolveram genitais femininos.
“Ainda não chegamos lá, mas o objetivo é estabelecer linhagens transgênicas de mosquitos que expressem o Nix em fêmeas, para convertê-las em machos inofensivos”, disse Zach Adelman, também coautor do estudo.
No Brasil, a estratégia de reversão sexual do mosquito tem sido pesquisada por um grupo do Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP), sob liderança da pesquisadora Margareth Capurro Guimarães. De acordo com Danilo Carvalho, aluno de doutorado orientado por Guimarães no ICB, a descoberta do novo gene pode contribuir para a estratégia de reversão sexual do mosquito, permitindo que os cientistas manipulem com mais facilidade a produção mosquitos transgênicos em laboratório.
“Uma das estratégias em desenvolvimento consiste em liberar no ambiente uma quantidade desproporcional de mosquitos machos geneticamente modificados que, ao cruzar com as fêmeas, geram uma prole estéril. Pela proporção, é grande a chance de as fêmeas copularem com os machos estéreis, gerando ovos inviáveis”, explicou Carvalho.
O problema, porém, é que ao criar grandes quantidades de mosquitos transgênicos, metade deles são fêmeas. A descoberta do novo gene poderia, portanto, facilitar o trabalho de produção de mosquitos machos. “Quando a estratégia é de liberação de mosquitos transgênicos, precisamos apenas de machos, por isso essas linhagens são fundamentais dentro da fábrica. Se produzirmos um milhão de insetos, uns 400 mil ou 500 mil serão fêmeas e temos que eliminar os bichos que não nos interessam”, afirmou.
Recentemente, a empresa britânica Oxitec liberou mosquitos geneticamente modificados em Piracicaba (SP), para tentar controlar a epidemia de dengue. Os mosquitos da empresa não são estéreis - ao contrário, são excelentes reprodutores -, mas têm um ciclo de vida curto. Com isso, os filhotes nascem “programados” para morrer antes de chegar à idade reprodutiva, o que reduziria drasticamente a população do mosquito e, consequentemente, a transmissão de doenças.
O estudo da Virginia Tech também poderia beneficiar esse tipo de estratégia, segundo Carvalho.
De acordo com Brantley Hall, outro dos autores do artigo na Science, o Aedes aegypti é uma espécie proveniente da África, que começou a ser espalhada pelo mundo em navios, no século 18. A espécie se tornou um problema de saúde global, porque é altamente adaptável aos ambientes humanos. O Aedes aegypti faz parte da pequena fração de espécies de mosquitos que transmitem doenças a humanos.
“A redução da população de Aedes aegypti em áreas onde eles não são nativos teria pouco impacto ambiental e traria grandes benefícios à saúde humana”, declarou Hall.
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