A Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular (SBCCV) lançará uma campanha nacional para que os seus 1,2 mil associados deixem de operar pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A medida drástica é uma retaliação contra o preço pago para a equipe cerca de R$ 940 para quatro cirurgiões e outros dois profissionais, no caso de uma cirurgia de ponte de safena. No Rio de Janeiro, planos de saúde pagam até R$ 13,5 mil pelo procedimento.A crise atinge alguns estados. Goiás não faz cirurgias cardíacas eletivas desde 2 de dezembro. O Ministério Público intermedia negociações entre médicos e a Secretaria de Saúde da Bahia para evitar que o serviço seja paralisado. Em São Paulo, os médicos ainda se organizam para criar uma cooperativa. O foco será a negociação com planos de saúde, que pagam cerca de R$ 1,5 mil por cirurgia para a equipe.
No Rio, os cirurgiões cardiovasculares anunciaram que vão interromper as cirurgias em outubro nos hospitais conveniados ao SUS. "O cirurgião cardiovascular hoje paga para trabalhar. Ele passa entre quatro e seis horas num centro cirúrgico, tem de ficar de sobreaviso para o caso de alguma intercorrência após a operação e, depois de 60 dias, recebe pouco mais de R$ 100 por aquele trabalho. É menos de R$ 30 por hora", afirma Ronald Souza Peixoto, presidente da cooperativa que reúne os 102 cirurgiões cardiovasculares do Rio de Janeiro.
Em 2009, esses médicos fizeram 8.303 cirurgias eletivas no estado fluminense aquelas que não são de emergência, como troca de válvulas cardíacas. Hoje, o paciente enfrenta uma fila de até seis meses para conseguir atendimento.
A briga com os estados e municípios ocorre porque a lei prevê que as secretarias de saúde façam a complementação do que é pago pelo SUS. De acordo com a sociedade, só Espírito Santo, Rio Grande do Norte e Paraíba pagam a diferença.
Segundo Gilberto Venossi Barbosa, presidente da SBCCV, a baixa remuneração tem feito com que menos médicos escolham a carreira. "O que explica que o SUS pague R$ 6 mil por um transplante hepático e a metade disso para o transplante cardíaco, que é uma cirurgia muito mais complicada?", questiona.
O secretário de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde, Alberto Beltrame, considera a remuneração das cirurgias cardíacas compatível com os recursos do SUS. "Não há como fazer comparações com o que é pago pelos planos", disse. Ele observou que o valor per capita por cirurgia na área privada é de cerca de R$ 1,4 mil, bem mais que o per capita do sistema público, que não chega a R$ 700. "Há subfinanciamento do setor", resume. "A tabela apresenta uma remuneração compatível com os recursos existentes." Beltrame ressaltou que não recebeu reclamação formal dos cardiologistas sobre a baixa remuneração. "Estamos abertos ao diálogo."