Brasília Às vésperas de completar 65 anos, a "bíblia" do trabalhador passa por atualização. O projeto de lei com a nova versão da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) foi encaminhado na quarta-feira à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Até março, devem entrar em vigor as mudanças que extinguiram 250 artigos, inseriram outros 1,3 mil e multiplicaram o número de profissões regulamentadas de 13 para 61.
A partir do ano que vem, constará na CLT todo o conjunto de regras para o registro profissional específico, por exemplo, de treinadores de futebol, peões de rodeio e guardadores de carros. Também serão abolidas normas esdrúxulas para os dias de hoje como a obrigatoriedade de um banquinho para descanso a toda mulher trabalhadora.
O autor da proposta, deputado federal Cândido Vacarezza (PT-SP), explica que o novo formato restringe-se a mudanças organizacionais. "Não estamos provocando qualquer alteração legal. Estamos tornando a legislação mais simples, clara e inteligível para os trabalhadores."
A declaração refuta a idéia de que o projeto seria um passo decisivo para a implantação da reforma trabalhista, sonho antigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "A ordem é revogar o que é obsoleto, escolher entre o que está coincidindo e incorporar o que não estava previsto", ressalta Vacarezza.
Criada em 1943 por Getúlio Vargas, a CLT ficou ao largo dos avanços nas relações de trabalho. Apesar de ainda servir de matriz para boa parte das categorias profissionais, já recebeu mais de 200 alterações. Além disso, teve de conviver com o inchaço de novas regras criadas por quatro novas Constituições Federais (1946, 1967, 1969 e 1988).
O excesso de regras virou paraíso de advogados, mas trouxe o caos para a cabeça do trabalhador comum. Exemplo disso é a regulamentação para a dispensa sem justa causa, que até 1966 era baseada apenas na CLT e garantia estabilidade ao funcionário após 10 anos no serviço. Nos últimos 40 anos, foram mais quatro alterações, até a vinculação à multa de 40% sobre o Fundo de Garantia sobre Tempo de Serviço (FGTS), o que ainda depende de uma lei complementar para ficar totalmente clara.
O principal mérito da nova consolidação será ordenar esse emaranhado de leis e, com isso, proporcionar mais segurança jurídica. O efeito seria a diminuição da morosidade da Justiça, da aplicação inadequada de penas e da impunidade.
O professor da Universidade de Brasília e especialista em economia do trabalho, Carlos Alberto Ramos, aprova a atualização, mas lembra da necessidade de uma modernização "conceitual" das relações entre empregado e empregador no país. "É necessário progredir para um sistema que proteja mais o trabalhador e menos o posto de trabalho." Segundo ele, é inaceitável que conflitos trabalhistas fiquem até 7 anos tramitando na Justiça. A solução seria a implementação de dispositivos que agilizassem as negociações. "Só que toda mudança realmente profunda enfrenta resistência por parte dos trabalhadores, que temem qualquer tipo de perda."
O presidente nacional da Força Sindical e deputado federal, Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), reflete esse sentimento. Ele apóia a modernização na CLT, mas é cauteloso. "Se não mexer com direitos dos trabalhadores, não temos nada contra."