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Além de servir para marcar contrastes do tipo "José estudou muito, mas não passou no vestibular" e "O time fez um excelente segundo tempo, mas não conseguiu reverter o placar", a conjunção "mas" é extremamente produtiva em construções que fazem emergir discursos que assinalam pontos de vista bastante negativos sobre grupos sociais (mas também profissões, religiões, etnias etc.) Que fique bem claro: não se trata de verdades finalmente ditas sobre este ou aquele grupo, mas tão somente de visões que desqualificam pessoas e que, muitas vezes, têm explicação e motivação históricas bastante óbvias.

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Lembremo-nos deste discurso, que é insidioso: "Ele é preto, mas é limpo". Aqui, o que fica subentendido, mas sem nota mínima de ambiguidade, é que a regra é esta: os negros são sujos; um negro limpo é exceção. É provável que, em nosso país, nem um outro grupo social seja tão desqualificado quanto os negros. Eis outros exemplos do que ouvimos: ele é negro, mas é honesto, ele é negro, mas é capaz, ele é negro, mas é gente boa. Em síntese: é negro de alma branca.

Sobre as mulheres também pairam julgamentos pesados, devastadores, e que, graças ao uso da conjunção "mas", vêm à tona, como nesta fala: "Ela é mulher, mas é inteligente" (ela é mulher, mas é capaz, ela é mulher, mas vai dar conta do recado etc.) Traduzindo: mulheres não são, via de regra, inteligentes, mas há exceções.

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Para finalizar, vamos ao título desta coluna. Num programa da Hebe, o jornalista Rodolpho Gamberini saiu com esta: "Eu sou jornalista, mas não estou mentindo". Disse em tom jocoso, todos riram. Porém o "mas" deixou subentendido um discurso bem pesado (acrescento: leviano) sobre os jornalistas e que não é preciso traduzir. Aliás, não é preciso. É aí que entra a importância do "mas".

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