Hoje volto ao assunto hipercorreção por causa de ocorrências que andei pescando em diversos materiais escritos e falados.
Antes de avançar, vejamos um exemplo típico de hipercorreção: "Fazem dez anos que não a vejo". O autor dessa frase levanta uma hipótese equivocada: ele interpreta "dez anos" como o sujeito da frase e, por isso, flexiona o verbo na terceira pessoal do plural. Acontece que essa frase não tem sujeito, o que obriga o verbo a ficar no singular (Faz dez anos). De modo bem simples, a hipercorreção se manifesta quando, na tentativa de acertar, corrigimos o que já está certo e aí erramos. Optamos por uma forma de prestígio em detrimento de uma estigmatizada. É o que acontece no exemplo que serve de título a esta coluna.
Como sabemos, a expressão correta é "Para (pra) mim, tanto faz". Ora, quase todos nós já a usamos pelo menos uma meia dúzia de vezes na vida. O que leva uma pessoa a escrever (o exemplo vem de um texto escrito) "Para eu, tanto faz"?
Uma explicação possível deve considerar essa construção em relação com outra, típica da fala da maioria dos brasileiros, qual seja, a produtiva e estigmatizada forma "para mim + infinitivo". Seguem exemplos: "Ele pediu para mim fazer um relatório" (fala de um advogado em situação informal); "Se for pra mim voltar lá, quero um aumento" (fala de uma auxiliar de enfermagem em situação informal).
O padrão escrito e falado é, nos dois casos, "para eu + infinitivo": para eu fazer um relatório e para eu voltar. Tudo indica que a pessoa que escreveu "Para eu, tanto faz" se lembrou dessa lição e a aplicou equivocadamente.
Finalizo lembrando que os brutos também amam e os letrados também erram. Em uma sentença, assim se expressou o juiz: "Tratam-se de crimes...". O correto é "Trata-se de crimes".
O erro do meritíssimo é típico de pessoas com boa escolaridade. Mas é um erro.
E a Justiça é para todos.
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