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Cristovão Tezza

A confraria secreta

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Por alguma razão que me escapa, Curitiba é uma cidade propícia a sociedades secretas. Bastaria citar o Instituto Neo-Pitagórico e a Ordem Rosacruz com seu incrível Museu Egípcio, mas há também a clássica Maçonaria (descobri perto de casa uma pequena praça triangular que homenageia os maçons) e uma Sociedade dos Templários – e recebi convite até de uma certa Ordem dos Gregários. Infelizmente, apesar do meu jeito extrovertido, inclinado a uma boa conversa, pelas vicissitudes da vida acabei me tornando um antissocial clandestino, aquele que disfarça bem o prazer de ficar sozinho, e nunca tive a felicidade de frequentar esses clubes iniciáticos.

Mas o espírito da cidade é tão envolvente que sem perceber acabei sócio-fundador de uma confraria secreta – que, por isso mesmo, não pode ter seu nome divulgado. Somos apenas em três, mas, embora exígua, a confraria é forte e já foi testada pelo tempo – são 25 anos de atividade, mantendo a mesma estrutura hierárquica e o mesmo regimento. Acho que não estarei ferindo o obrigatório sigilo ao informar que sou o Secretário-Geral, encarregado da pauta das reu­­niões. A confraria conta com um Grão-Mestre, responsável pela logística de transporte e orientação dos trabalhos, e que vem se mostrando um zeloso mantenedor da hierarquia que lhe garante o topo da pirâmide; e com um Confrade Júnior, que eventualmente carrega o piano transcrevendo as atas. Quanto a mim, estou satisfeito com meu cargo de Secretário.

A confraria é ecumênica: há um atleticano (infelizmente, não posso revelar quem é quem), um coxa-branca e um paranista. No mundo da política e da economia, para não dizer que um é de direita, outro de esquerda e outro de centro, informo que um dos confrades é liberal em matéria econômica, outro gosta de um capitalismo de Estado e um terceiro defende uma terceira via, mas ninguém abre mão da democracia como sistema de governo. Na esfera religiosa, ateus e cristãos convivem em harmonia. Em época de eleições, sempre há rachas na Confraria. Preveem-se debates acalorados sobre quem deve ser o próximo prefeito. Acalorados, mas em voz baixa: todas as reuniões são sussurradas em restaurantes da cidade, o que, curiosamente, está fazendo da confraria um dos mais abalizados termômetros da gastronomia curitibana dos últimos anos. Estamos preparando um documento secreto a respeito, mas por enquanto já posso adiantar que a grande maioria dos nossos restaurantes prevê pratos apenas para duas pessoas, nunca para três – o que nos exige gambiarras no cardápio de modo a manter a quantidade equilibrada sem assaltar o bolso. E as contas são sempre curitibanamente divididas até os centavos.

Amanhã temos assembleia; nervoso, já preparei uma defesa prévia à muito provável acusação de eu cobrir minha falta de assunto com a exposição sensacionalista da nossa discreta instituição.

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