Os meus 16 leitores já devem ter percebido que há um bom tempo não tenho comentado assuntos do dia. Estou tirando umas férias do noticiário, para recarregar minhas baterias, uma espécie de terapia mental: a alface saudável, a granola sem açúcar e o abacate com limão equivalem a leituras clássicas, passeios no parque, sonecas à tarde e filmes avulsos. Fujo das manchetes e das informações como se fossem gordura trans, concentrados de colesterol, açúcar refinado, monóxido de carbono. No som do carro, mais blues e menos notícia. É uma pausa para respirar. O momento é propício. Depois de oito anos de Lula, o silêncio de Dilma soa como uma dádiva, um presente dos céus, uma gentileza oficial, enfim uma cortesia do Palácio chegando aos ouvidos dos súditos obrigado, presidente Dilma, por falar pouco! Nem sei se o governo dela está bom ou ruim; é provável que continue tudo como antes no quartel de Abrantes, mas com o mérito do silêncio, que é de ouro e merece respeito.
Só que algumas notícias são tão bombardeadas que não há como escapar. Minha leitura automática de portais da internet começou a esbarrar em Gisele Bündchen; até aí, nada demais, a moça é célebre. E junto com ela veio um pacote publicitário de impacto suficiente para se tornar notícia. Uma propaganda de lingerie, o que também é corriqueiro, no nosso abençoado país do carnaval e de mulher bonita. Súbito, enfim prestando atenção, descobri que o governo brasileiro, pela Secretaria de Política para as Mulheres, da Presidência da República, quer proibir uma propaganda de calcinhas e sutiãs. Eu terei entendido bem?
É isso mesmo: a propaganda de lingerie foi acusada do pior crime intelectual do momento: ser politicamente incorreta. No comercial, Gisele mostra que o modo "certo" de dizer ao marido que estourou o cartão de crédito ou bateu o carro é vestindo lingerie, acompanhada daquele charme feminino que Deus lhe deu. Bom gosto? Mau gosto? Achei apenas engraçada. Em qualquer caso: e daí? O que o governo tem de meter o bedelho nisso? A acusação de que a propaganda é sexista e reitera o papel subalterno da mulher na sociedade brasileira, ou qualquer outra preguiçosa ilação de uma real situação feminina, não esconde a vocação totalitária de controle do pensamento. Exagero do cronista? Não, é exatamente isso: o medo da liberdade. Para esses arautos da estupidez, é preciso controlar o pensamento antes mesmo que ele se formalize; existe um modo "certo" de pensar (como uma publicidade de calcinhas levada a sério), fora do qual devemos ser punidos, e este modo jamais contempla o humor, que deve ser proscrito. Nesta lógica, o cidadão tem de ser tutelado haverá sempre um pateta oficial a zelar por nós, com a lei na mão. Mais um pouco, e piadas sobre papagaios serão enquadradas pelo Ibama.Ora, essa turma que vá catar coquinho e nos deixe em paz.
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