Passada a tormenta dos votos brancos, nulos e válidos, ultrapassamos também a fase dos votos de pêsames endereçados aos perdedores e eis que já estamos no fim de ano, na fase dos votos de felicidades. São dois tipos de votos de júbilo: um sem aspas, outro com aspas. Tem o sincero voto de felicidades, que dispensa aspas, e tem o irônico voto com aspas: "Felicidades!"
Curto e grosso, com exclamações e aspas, francamente, partido do vencido ou do vencedor, todo voto de felicidade vem com o carimbo da hipocrisia. O veneno da ironia. Os inimigos não mandam flores. No máximo, telegrama de "felicidades".
Aspas para Aldous Huxley: "Posso simpatizar com a dor de uma pessoa, mas não com os seus prazeres. Há algo curiosamente monótono na felicidade dos outros".
Felicidade é uma palavra que exige aspas. Por isso é preciso haver aspas no discurso da vencedora, ao conclamar o povo para a reforma política: "A palavra mais repetida, mais dita, mais falada, mais dominante foi mudança. O tema mais amplamente invocado foi reforma. Sei que estou sendo reconduzida à Presidência para fazer as grandes mudanças que a sociedade brasileira exige. Dentre as reformas, a primeira e mais importante deve ser a reforma política", afirmou Dilma.
Não precisava tanto palavrório. Melhor seria se ela reunisse a imprensa para simplesmente dizer o seguinte: "Desejo a todos os meus votos de felicidades. Com aspas! E nada mais tenho a declarar, mesmo sem aspas!"
Aspas para George Bernard Shaw: "Uma vida inteira de felicidade! Nenhum homem vivo conseguiria suportá-la. Seria o inferno".
Todo marido traído tem aspas. Quem bebe socialmente não usa aspas para reconhecer que é alcoólatra. O padre que nos perdoe, "até que a morte os separe", só com aspas. Sem aspas, o futebol perde a sua graça: "Vamos continuar trabalhando forte", diz o desolado lateral; e o técnico "continua prestigiado".
Aspas não são apenas sinais que abrem e fecham a citação. Têm outros significados: no linguajar gaúcho, "bater aspas" quer dizer bater a orelha. Como expressão popular, "fincar as aspas" é o mesmo que cair de cabeça para baixo. E "fincar as aspas no inferno" é o mesmo que desejar a morte à pessoa indesejável.
Abrindo outro parágrafo para a "presidenta" que vai continuar brigando com as palavras (com aspas e sem aspas), doravante devemos prestar muita atenção nas aspas dos candidatos a ministros, nas aspas dos partidos de apoio, nas aspas do mercado, nas aspas da Polícia Federal, nas aspas dos delatores e nas aspas da oposição.
Nada melhor do que um fim de semana para esfriar a cabeça. Agora é momento de lamber as feridas, serenar os ânimos e desejar aos vencedores e vencidos os nossos sinceros votos de felicidades. Sem aspas.
Em contrapartida, vamos cobrar aqueles votos de bem-aventurança que os eleitos nos prometeram durante a campanha. Sem aspas.
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