Em São Luís do Purunã, aldeia aninhada na borda da serra, tendo acima quatro quintos de céu e em torno assombrosa amplitude, ocorreu um interessante fenômeno migratório do teatro paranaense. Entre as décadas de 1960 e 1980, a classe teatral tinha Antonina como camarim junto à Baía de Paranaguá, serra abaixo. Na virada do século, nossos artistas debandaram. Agora, os astros contracenam com a paisagem dos Campos Gerais, serra acima.
Fauna inquieta, hoje é mais fácil encontrar a classe teatral tomando mate em São Luís do Purunã do que cerveja no Bar e Restaurante Palácio, antes o poleiro noturno dessas aves de arribação de Curitiba. Quem puxou o êxodo serra acima foi o casal Regina Bastos, atriz, e Beto Bruel, premiado iluminador de nome nacional. Herdeiro de nascentes do Rio Tamanduá e descendente de povoadores franceses, Bruel tem aprazível herdade em São Luís do Purunã. Pelo caminho de Campo Largo, seguiu ainda o casal Fátima Ortiz, irmã de Regina, e Enéas Lour: autores e diretores teatrais, formaram um condomínio (dacha, preferem os visitantes) com a generosa família Bruel.
Luis Melo não achou um diamante. Com suas economias, criou um tesouro
No refúgio a 40 quilômetros de Curitiba, também entrou em cena o consagrado ator e diretor Luis Melo: o astro da Rede Globo, agora empreendedor visionário, implantou com recursos próprios o Campo das Artes, conceito de oficinas com residências artísticas em São Luís do Purunã.
O regulamento de hospedagem da Pousada Parque São Luís do Purunã diz, no item 6: “Uma das primeiras atividades econômicas de São Luís do Purunã foi o garimpo de diamantes. Se achar algum, por favor, divida-o conosco”.
Luis Melo não achou um diamante. Com suas economias, criou um tesouro. Se ainda não acharam fortunas nas pousadas do Purunã, o futuro promete uma corrida ao Campo das Artes, mina de raros minérios que Luis Melo vem lapidando na borda da Serra. Quem acompanha o criador na obra em acabamento não deixa de perceber o ator interpretando Oscar Niemeyer ao apresentar Brasília à posteridade. Com cinco alqueires, o complexo cultural tem, como camarote principal, um leque de concreto debruçado sobre o vale, fenda da serra que liga visualmente o Primeiro e o Segundo Planalto. No vértice desse leque, domina o conjunto um prédio multiuso de dois andares, pé-direito alto, com revestimento em madeira, reciclada das obras de concretagem, compondo geometrias onde a cor laranja se harmoniza com o azul e verde dos Campos Gerais. Dotado de completa infraestrutura (banheiros, cozinha, restaurante, camarins, depósito de cenários, móveis, objetos, iluminação), assistido por dois mezaninos, o imenso cubo faz as vezes de teatro, oficina de ensaios, sala de conferência e o que mais a generosidade de Luis Melo agregar.
Junto à varanda de concreto debruçada na paisagem, outras cinco edificações menores vão completar a singular personalidade do conjunto arquitetônico realizado pelo arquiteto José Carlos Serroni. Na concepção de Melo e Serroni, o leque do Campo das Artes está aberto para um generoso espaço dedicado à criatividade, mais uma biblioteca real e virtual, dirigida com ênfase às crianças nativas de São Luís do Purunã.
Pouco tempo atrás um diamante do Rio Tamanduá foi vendido a um joalheiro de Curitiba. Prova de que, em São Luís do Purunã, o sonho ainda não acabou. E o de Luis Melo apenas começou.
(Do meu livro Serra Abaixo; Serra Acima: o Paraná de trás pra frente)