Enquanto serra acima a temporada do pinhão começa no dia 15 de abril, serra abaixo a temporada da tainha começa no dia 15 de maio. E, juntando coisa com coisa, temos a receita de confraternização entre o Paraná e Santa Catarina: tainha assada com pinhão.
Se na Guerra do Contestado um pacificador com dotes culinários reunisse em torno da mesma mesa as partes em litígio, ninguém sairia do rega-bofe com a pança cheia de chumbo grosso. O monge José Maria, Carlos Cavalcanti (presidente do Paraná), Vidal Ramos (presidente de Santa Catarina), autoridades civis e militares, federais ou estaduais, pelados e peludos, todos chegariam ao consenso dos saciados, brindando as sábias palavras de Lord Byron: "Comer, beber e amar. O resto não vale um níquel!"
Palitando um dos dois derradeiros dentes da boca, com olhar apaziguado, o monge diria ao coronel João Gualberto: "Tainha recheada com pinhão, ora essa! Onde foram buscar essa receita?" O gringo da Southern Brazil Lumber&Colonization Company Inc., raspando a tigela de sagu com creme, chamaria então à mesa de negociações o pacificador de forno e fogão, para revelar o segredo do armistício: "De origem é fifty-fifty, ou mezzo a mezzo", diria o diplomata da gula, detalhando em seguida os ingredientes básicos: "uma tainha grande e limpa; quatro limões; uma cebola; dois tomates; 1/2 xícara de salsinha; 1/2 xícara de cebolinha; três dentes de alho; sal a gosto; palitos de dente; folha de bananeira e um quilo de pinhão. Para o recheio, cozinhe o pinhão sem sal. Após, descasque o pinhão e o triture".
Monge José Maria, que da cozinha só conhecia o fogo dos infernos, levantaria uma questão prática relevante: "Triture? Como assim?" Com paciência, explicaria o pacificador: "Esmigalhar! Triturar. Na cidade grande se usa um descascador de pinhão. Funciona que é uma maravilha!"
Prosseguiria o pacifista da tainha com pinhão: "Pique os tomates, a cebola e os temperos. Misture com o pinhão esmigalhado. Na tainha, faça aproximadamente quatro talhos nos dois lados do corpo, tempere com limão e sal. Deixe descansar por 15 minutos. Recheie a tainha e feche com palitos de dente. Enrole na folha da bananeira e coloque na grelha para assar por aproximadamente uma hora".
De pandulho forrado, o beato José Maria entregaria o facão e a garrucha ao coronel João Gualberto e, depois de um forte abraço no gringo da estrada de ferro, proporia um brinde ao casamento da tainha com o pinhão, mencionando o velho dito dos caiçaras: "Céu pro oeste esgazeando, muito frio na serra, muito pinhão caindo, muita tainha chegando!"