Não importa o que aconteça
Lembre-se:

Do que você realmente é,

Não se esqueça

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Os antigos gregos contavam que Zeus, a suprema divindade do Olimpo, na aurora dos tempos decidiu intervir no caos que grassava no universo. Cansado da enorme bagunça, pôs o mundo em ordem: deu nome e função a tudo que existia, coisas e seres.

Haveria desde então um dia sempre após uma noite; luz depois das trevas. E também a primavera sucederia ao inverno; o calor ao frio. A água correria inexoravelmente para o mar. Uma parte dela, aquecida pelo sol, iria evaporar e voltaria à terra na forma de chuva. E ela daria viço aos bosques e florestas, que alimentariam os animais.

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As musas iriam correr o mundo soprando inspiração aos humanos. E eles, tocados pela beleza da arte e do conhecimento, poderiam se lembrar

Ah! E, por falar em animais... Dentre eles, Zeus elegeu um para soprar-lhe a fagulha de divindade: deu-lhe um coração com sentimentos e uma cabeça com razão. E a esse ser, que reinaria sobre os demais, foi-lhe dado o nome de homem.

E então Zeus batizou de Cosmos a bela harmonia que acabara de criar. Orgulhoso, ofereceu um banquete aos outros deuses para exibir-lhes a perfeição de sua criação. E enquanto todos se deleitavam diante de tamanha beleza, perguntou, todo-poderoso, de forma retórica:

“Caros, o que acharam do Cosmos? Fiz um bom trabalho, não? Falta-lhe algo?”

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Foi quando, ousadamente, ergueu-se uma voz. Era a de Apolo, justo o patrono da perfeição, da harmonia e da verdade: “Sim, falta algo!”, exclamou, para a surpresa geral.

“Como assim?!?”, perguntou Zeus, atônito diante da insolência.

“Com o devido respeito, há, sim, uma deformidade insuspeita e grave em tua grande criação. Faltam criaturas que reconheçam a beleza deste vasto mundo que ordenaste e que expressem a gratidão de simplesmente viver.”

“Faze-me rir, Apolo! Por acaso não percebeste que criei o homem para tal?”, questionou Zeus. No que Apolo retrucou:

“Esse ser animado pela centelha celestial, a quem chamaste de homem, é capaz de ver a beleza do Cosmos. E de perceber-se como parte dele. Mas está mal-acabado... O homem é, afinal, um ser que esquece. Por isso está eternamente fadado a não lembrar de quem realmente é. Animal ingrato esse homem: quase divino, mas insensível a si mesmo e a tudo o que o rodeia! Animado e aquecido pelo fogo dos céus, mas inacabado, inclinado ao embotamento, ao esquecimento! E, ao esquecer-se de sua natureza, não pensará o homem ser o senhor de tudo? Por certo que sim, garanto-te, Zeus! E asseguro-te que logo começará a se comportar como as demais bestas desprovidas de razão e sentimento. E eles, os homens, não tardarão a enxergar apenas a si mesmos. A brigar entre si. A começar a destruir tua bela criação.”

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Zeus silenciou. Pensativo, caiu em si. A festa acabara. “Fora, todos! Quero ficar só!”, disse.

Ele havia, de fato, cometido um erro absurdo. Era preciso remediar a grotesca falha. Mas o que fazer? Depois de muito refletir, Zeus chamou a bela Mnemosine, deusa da memória. Seduziu-a e deitou-se com ela por nove noites seguidas. E então Mnemosine deu à luz nove meninas – as musas, inspiradoras das artes e das ciências.

Zeus ofereceu, então, suas filhas como dádiva à humanidade na tentativa de resgatá-la da sina do esquecimento. Sim, essa era a solução. As musas iriam correr o mundo soprando inspiração aos humanos. E eles, tocados pela beleza da arte e do conhecimento, poderiam se lembrar. Não dos afazeres cotidianos, do trabalho, dos estudos, dos compromissos, do lazer de fim de semana, de ganhar dinheiro. Isso é fácil de não esquecer. Mas se lembrar de quem realmente são. Do que realmente importa.

Agora que 2015 chega ao fim, quando costumamos fazer um balanço do que passou e a tomar resoluções de ano-novo, talvez valha apenas lembrarmo-nos de quem realmente somos. E tentar nos transformar nessa pessoa.

Tiro duas semanas de folga e volto a escrever em 13 de janeiro. Feliz Natal e um bom ano-novo!

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