A notícia divulgada na segunda-feira de que a China superou o Japão no posto de segundo país com o maior Produto Interno Bruto (PIB) do planeta não tem implicações meramente econômicas. A emergência do dragão chinês, cada vez mais consolidada, é também um fato político.
O modelo de dirigismo capitalista estatal adotado por Pequim, alicerçado em uma ditadura das mais rígidas, é um sucesso do ponto de vista da economia. E um risco de tornar-se exemplo político para países em que a democracia ainda não está bem sedimentada.
Os chineses provaram que capitalismo sem instituições democráticas é uma equação política e economicamente possível. Tudo isso apenas 21 anos após a queda do Muro de Berlim e a implosão das ditaduras comunistas. À época, propagou-se a tese do pensador norte-americano Francis Fukuyama de que a História havia chegado ao fim com a vitória incontestável do modelo de capitalismo democrático. Ou seja, só nações com economia de mercado e instituições democráticas poderiam se desenvolver.
Duas décadas depois, o crescimento da China mostrou que a avaliação de Fukuyama estava equivocada. Na verdade, isso não chegou a ser uma surpresa, pois já existiam exemplos históricos anteriores de que o autoritarismo é plenamente compatível com crescimento econômico. O "milagre brasileiro" da década de 70, operado em plena ditadura militar, é um caso. A Alemanha nazista é outro.
O capitalismo não traz em si valores éticos ou políticos. É apenas um sistema econômico regido pela lógica da competição, pela qual as empresas mais competentes vencem e permanecem no mercado. Valores morais ou políticos são inoculados no mercado por instituições de natureza não econômica como a religião, os costumes da comunidade e a política.
Como a democracia é acima de tudo um valor político, uma escolha de determinada sociedade, ela não necessariamente vai caminhar junto da economia de mercado esta sim uma imposição histórica. As nações não podem mais optar por estar fora do capitalismo todas que tentaram isso (ou ainda tentam) fracassaram. Mas os países podem escolher se serão democráticos ou autoritários.
Nesse sentido, o exemplo da China, que entre 15 e 25 anos deve superar a economia dos EUA, é uma ameaça global. Ele tende a incentivar líderes políticos e cidadãos a aceitar a troca de um pouco de democracia por mais crescimento econômico, em nome do bem da nação.
É preciso ficar atento, portanto. Em democracias não consolidadas, como a brasileira, essa troca pode vir suave em um processo lento mas contínuo de desconstrução das instituições democráticas. A troca pode aparecer, por exemplo, na tentativa de suprimir ou restringir etapas do rito democrático, que costuma dar trabalho e exigir tempo da sociedade. Afinal, nas democracias é preciso discutir muito, negociar, tentar contemplar interesses divergentes. É mais fácil e prático tomar decisões rápidas e tecnocráticas, nem que seja pela imposição. É isso que faz a China.
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