O futebol é visto por pensadores socialistas como o ópio do povo, um entretenimento que desvia a atenção das pessoas a respeito daquilo que realmente interessa para suas vidas – a política. Outros intelectuais criticam a espetacularização do esporte: o futebol, como negócio, precisa oferecer ao público um show e os jogadores são necessariamente elevados à condição de astros, despertando o excessivo culto aos ídolos. Há ainda analistas que veem no esporte das multidões uma espécie de catarse da sociedade atual, onde a violência se manifesta de forma corriqueira nas brigas entre torcidas.

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As análises a respeito da alienação social, da espetacularização e da violência do futebol não explicam, porém, o que faz esse jogo atrair multidões como as que lotam os estádios em épocas como esta, de decisões de campeonatos. Gosto de pensar que a paixão do brasileiro pelo futebol se justifica, inconscientemente, pelo fato de o jogo espelhar a sociedade que gostaríamos de ser.

O antropólogo Roberto DaMatta, um dos maiores intérpretes do Brasil na atualidade, lembra que o futebol é um jogo altamente igualitário, ao contrário de nosso país profundamente desigual. Os dois times iniciam a partida com as mesmas chances de vencer. As regras também são iguais para todos os jogadores. Não é preciso se alongar muito para constatar que nosso sonho é justamente uma sociedade com igualdade de oportunidades e leis que valham do mais simples engraxate à mais alta autoridade de Brasília.

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Além disso, dentro das quatro linhas o mérito prevalece. A não ser que haja algum juiz mal-intencionado ou incompetente, quem vence teoricamente é o melhor, o mais competente – diferentemente da vida social, em que ainda funciona a lógica dos apadrinhamentos.

No futebol, também não há divisões raciais e sociais. Todos, sem distinção de cor ou de condição econômica, jogam e torcem por um mesmo objetivo. E o negro pode se destacar tanto quanto um branco. Ou até mais. Pelé, o rei do futebol, está aí como prova viva.

Mas quando veremos essa sociedade sem preconceito na política? Quando, por exemplo, um negro chegará à Presidência da República? E, ainda que tenhamos hoje um presidente nascido pobre, temos de reconhecer que os cargos políticos e empresariais de destaque no país ainda são ocupados por pessoas majoritariamente nascidas em famílias abastadas ou remediadas – bem ao contrário da origem humilde da maioria dos grandes craques brasileiros.

Além disso, vale lembrar ainda que é exatamente esse esporte tão diferente da realidade das ruas, que une em um mesmo selecionado os que mais se destacam em sua atividade, sem qualquer tipo de preconceito racial ou social, que nos leva a sentir orgulho perante o mundo. É nesse esporte que somos, enfim, os melhores do planeta por cinco vezes – feito não alcançado por nenhuma outra nação. O futebol brasileiro é a realização plena das potencialidades de nosso povo.

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Aos meus leitores, informo que estarei em férias nas próximas semanas. Volto a escrever neste espaço no dia 10 de junho.

Fernando Martins é jornalista.