Já ouvi pessoas de fora de Curitiba relatando que jogavam lixo nas ruas de suas cidades, mas que se sentiam envergonhadas de fazer o mesmo na capital paranaense simplesmente porque os moradores daqui (ao menos uma boa parte deles) costumam usar as lixeiras – e não porque há uma lei que proíba essa atitude. É um exemplo de como uma tradição – no caso, a do apreço dos curitibanos pela limpeza – pode contribuir positivamente por meio do constrangimento social. Tradições funcionam como uma espécie de guia para que as pessoas possam se situar na sociedade em que vivem.

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Mas elas também podem ser perniciosas, “autorizando” comportamentos inadequados. Esse parece ser o caso da Receita Estadual. Segundo as investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), a corrupção no Fisco do Paraná já dura 30 anos, passando por oito gestões estaduais – não necessariamente de forma sistemática. Contudo, a persistência das supostas irregularidades ao longo das décadas, se realmente for confirmada, só pode ser explicada por meio de uma espécie de tradição interna do órgão, à qual os novos fiscais que entram na Receita se sentem constrangidos de se opor e que acaba por seduzir parte deles para cometer atos ilícitos.

Além da aplicação da lei àqueles que cometem irregularidades, a solução para os problemas das instituições públicas também está em modificar os maus costumes arraigados

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As tradições – as crenças, atitudes e costumes partilhados por uma comunidade – são, nesse sentido, muito mais fortes que as leis e as normas.

Em certa medida, é o que ocorre em muitas outras instituições que apresentam disfunções. As polícias brasileiras são consideradas violentas não porque isso esteja escrito em seu estatuto, mas porque esse comportamento é partilhado por parte expressiva de seus integrantes. O Judiciário, que pela legislação tem de zelar pela igualdade dos cidadãos, costuma buscar benesses para seus membros sem ver nenhum problema nisso. E assim podem ser listados tantos outros casos.

Desse modo, pode-se dizer que, além da aplicação da lei àqueles que cometem irregularidades, a solução para os problemas das instituições públicas também está em modificar os maus costumes arraigados – até porque alguns deles nem mesmo são ilegais, mas apenas imorais.

A dificuldade é que tradições não costumam ser criadas; surgem espontaneamente. Pode ser inútil tentar “inventar” novos hábitos para impô-los a um determinado grupo.

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A despeito disso, as tradições ruins podem e devem ser criticadas. E as críticas e a exposição públicas costumam criar o saudável constrangimento que dificulta que esses costumes se perpetuem. Mais ou menos como alguns forasteiros sentem-se ao chegar a Curitiba e ao jogar um papel de bala no chão.