Os conflitos bélicos eram uma ameaça constante na Antiguidade. A “arte da guerra” – o estudo de estratégias de ataque e recuo para conquistar ou defender territórios – se impunha como uma inevitável necessidade. Na Antiga Grécia, essa disciplina era chamada de polemikós, derivada de polemos (guerra) e ikós (de). Nossa “polêmica” nasceu daí. Espadas depostas, as palavras as substituíram. E, aos poucos, o termo passou a significar apenas o choque público de opiniões divergentes, os debates acalorados sobre a vida em comunidade.
Ainda que a “polêmica” nunca tenha perdido seu DNA bélico, essa característica havia se atenuado ao longo dos tempos. Mas as redes sociais e a recente polarização da sociedade trataram de despertá-la com força.
Polêmicas nunca vão acabar. Afinal, é impossível concordar com tudo o que os outros pensam. O problema é que o polemismo – a criação da polêmica fácil – tem crescido. E acaba por levar ao debate público as paixões mais que a razão. E paixões, a despeito de promoveram uniões fortes, também dividem na mesma intensidade. Podem até mesmo provocar violência real.
Polemistas – gente que apela às paixões ao se posicionar – sempre existiram. Mas ganharam espaço notável com a internet e o ressurgimento da política dos extremos. Tendo em mãos a possibilidade de publicar o que quiser na web e sem a voz de outra pessoa para questionar “Ei, você não acha que está exagerando?”, muitas ofensas e impropriedades tornam-se públicas.
O discurso passional, que desperta amor e o ódio, funciona no mundo virtual
O pior é que o discurso passional, que desperta amor e o ódio, funciona no mundo virtual. Gera engajamento fácil daqueles que concordam e discordam. Em outras palavras: produz popularidade por meio de comentários e cliques. A internet vive de cliques. E políticos, de popularidade.
Sabendo disso, muitos polemistas (e políticos) conscientemente escolhem os termos que vão usar para gerar as paixões que os tornarão “populares”. Semeiam essas palavras e expressões-chave pelo texto ou discurso. Até pode ser que haja argumentos racionais ali. Mas eles acabam sendo contaminados pelos elementos passionais. Como um café que perde seu sabor original ao ser adoçado em excesso. Sobra a impressão mais forte.
Mas o polemista em geral não vai admitir ser um polemista e sempre terá como escudo os seus argumentos racionais – embora use as emoções fáceis como espada na sua batalha para conquistar o território on-line.
Algumas táticas são típicas dessa guerra. Uma delas é o uso de frases definitivas para situações que estão longe de serem definitivas. Pense em algo – qualquer coisa – que está por aí e no qual muitos acreditam ou gostam. Então diga que esse algo acabou. Que está morto. Que é lixo. Pronto, polêmica criada.
Polemista também adora generalizações. A esquerda é isso. A direita é aquilo. Mulheres são assim. Homens, não. E ponto final. Mais polêmica criada com aqueles que não se enquadram nessas simplificações.
O apelo aos extremos é outra artimanha do polemista. Ocorre, por exemplo, quando ele chama algo ou alguém de fascista ou comunista. A imensa maioria das instituições e pessoas está muito longe de poder ser classificada como um ou outro. Mas o que importa para o fabricador de polêmicas é que as palavras são fortes. E servem como um xingamento de alto calão, pretensamente politizado.
O bom polemista também sabe travestir seus xingamentos e preconceitos para, depois, dizer que não era bem assim. O diminutivo costuma servir a esse propósito. Uma ofensa que se torna “ofensazinha” parece mais leve. E até mesmo um elogio, ao se transformar em “elogiozinho”, pode ser na verdade um xingamento virado do avesso pela ironia.
Mas nenhum polemista consegue se defender de uma arma que é acessível a todos: a indiferença. Ele não pode lutar sua guerra pessoal se for solenemente ignorado.
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