No primeiro dia de abril cerca de 200 voluntários encheram e soltaram 100 mil balões na Praça Taksim, Istambul, Turquia. Conhe­­cido como "Istambul está rindo", o evento foi um esforço de lembrar as pessoas a rirem mais. Um preconceito difundido diz que os turcos da Turquia não têm o costume de gastar sua energia movendo músculos para sorrir. No Brasil, esse problema não existe. Da boca para fora o riso é festejado. Entretanto, aqui muita energia é gasta na tentativa de reprimir as manifestações mais extravagantes de humor.

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Com a onda do politicamente correto, grupos étnicos, minorias e alguns valores culturais são considerados temas sérios demais para que possam ser objeto do riso. Não raro os adeptos dessa corrente vão procurar espaço junto à opinião pública para protestar contra as manifestações de humor mais extravagantes. Tentam aprisionar o riso a limites estreitos, com base na crença de que assim colaboram para a construção de um mundo mais igualitário. Acreditam que ao impedir manifestações satíricas, o mundo mudará. Atacam logo o riso, a primeira forma de respeito.

É preciso separar as manifestações satíricas do comportamento discriminatório. Não há vínculo necessário entre eles. Nada garante que membros de patrulhas ideológicas assumirão comportamentos que conduzam a um mundo mais igualitário que os adeptos do riso. Da mesma forma, nada garante também que o preconceito e a discriminação aumentem por causa do humor transgressor.

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O riso tem a propriedade de expor as contradições do mundo, os defeitos e o ridículo do ser humano. Ajuda a lembrar que a existência é curta e que boa parte dela está ocupada pelo sofrimento, angústia e medo. Pelo riso, a consciência da realidade se tor­­na plena. Dá forças para festejar a vida e para aceitar a morte. As dificuldades da existência são levadas à consciência e contribuem para dar uma perspectiva mais positiva da vida.

Pode parecer estranho aos adeptos do politicamente correto, mas, dentro de uma perspectiva em que se permite rir de si mesmo, de tudo e de todos, não há como existir o desrespeito, ao satirizar minorias ou culturas estrangeiras. Pelo contrário, no riso todos são iguais. Pois, desse ponto de vista, o humor aniquila a crença de superioridade perante os demais. Todos são motivos de riso. Ele atinge o mundo todo e o transforma. Desempenha um papel tão importante quanto o da seriedade para compreender a vida e criar um sentido para ela. É por isso que se diz que o riso, ao lado da consciência da morte, é algo próprio do homem (e da mulher, é claro), diferenciando-o (a) dos outros animais.

Mas, por óbvio essa concepção de riso universalizante é ideal. Alguém que risse o tempo todo de si e de todos teria um lugar muito particular nesse mundo – seria o bobo da Corte, o arlequim. Contudo, já bastaria um pouco mais de tolerância com o humor alheio, mesmo que possa atingir convicções pessoais. Respeitar o riso dos outros seria a apoteose da diversidade.

Para trazer essa perspectiva do riso para mais próximo do cotidiano, talvez valesse a pena seguir o exemplo das crianças turcas, mais especificamente, as do primeiro dia de abril da Praça Taksim, Istambul, Turquia. No "Istambul está rindo" foram elas as pessoas que mais se divertiram. Entregaram-se à brincadeira de ver quem mais conseguia estourar os balões.