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Dinheiro na mão é vendaval. A expressão, cunhada por Paulinho da Viola na canção Pecado Capital, se popularizou como metáfora da tentação de gastar tudo o que se tem, embora a letra trate justamente do contrário: a avareza. Apesar de a prodigalidade e a ganância aparentemente serem incompatíveis, os dois desvios de conduta se reconciliam no Legislativo brasileiro, tal qual na interpretação que a voz da rua deu à música. E essa perversa simbiose política é um dos principais pecados capitais da democracia no país.

O Parlamento nacional é pródigo com o que é dos outros: gasta muito o dinheiro público. E avaro para redistribuir o que é seu: concentra muito recursos para manter a si mesmo e a seus privilégios, ainda que o país tenha carências urgentes em outras áreas.

Aos fatos. Em matéria publicada na segunda-feira pela Gazeta do Povo, as repórteres Katia Brembatti e Gisele Barão mostraram que o Congresso Nacional tem um orçamento maior do que o de sete estados (Acre, Alagoas, Amapá, Piauí, Rondônia, Roraima e Sergipe). Além disso, a verba de que o Legislativo nacional dispõe é maior do que a de ministérios estratégicos como os da Ciência e Tecnologia e da Justiça (responsável pelos investimentos em segurança). São R$ 7,6 bilhões anuais para custear as despesas de 513 deputados, de 81 senadores e da máquina burocrática que gira ao redor deles.

O Poder Legislativo é essencial a qualquer democracia. Isso não se discute. Mas há algo de muito errado quando se destina mais dinheiro às atividades de 594 "excelências" do que para milhões de brasileiros que convivem diariamente com a escassez de serviços públicos.

Há algo de mais errado ainda quando isso se repete em diversas instâncias legislativas estaduais e municipais. O caso da Assembleia Legislativa do Paraná é exemplar. No ano passado, após uma série de denúncias de corrupção e de mau uso do dinheiro público, a Casa descobriu gastos desnecessários de R$ 90 milhões. Houve um aperto de cintos. O Legislativo continuou a funcionar normalmente. E ainda destinou a sobra para obras e programas que beneficiam diretamente a população. O dinheiro na mão da Assembleia era vendaval. Mas virou solução, como bem diz a música de Paulinho da Viola.

Para quem não se recorda ou desconhece a letra da canção, vale lembrar ainda que dinheiro na mão também é solidão. A avareza, afinal, distancia o homem de seus semelhantes. O mesmo ocorre com o Legislativo. Está se afastando da sociedade ao se fechar em si. Esse é o pecado capital da política brasileira. Um mal que leva à perigosa descrença na democracia.

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