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Fernando Martins

Se Darwin explicasse o curitibano

O frio que tomou conta de Curitiba nos últimos dias inevitavelmente nos tornou mais reclusos. Sair de casa? Só se for por obrigação, necessidade ou muita força de vontade. E foi no aconchego do lar, escutando o barulho da chuva intermitente de uma de nossas manhãs geladas, que uma dúvida voltou a martelar meus pensamentos: o clima pode explicar o comportamento fechado que se atribui ao curitibano?

Darwin dizia que as espécies se adaptam ao ambiente. Com os homens se dá o mesmo. Num clima pouco convidativo como o da capital paranaense, não dar as caras à rua, isolar-se em casa seria um comportamento natural. O espaço de convívio, portanto, é familiar: a residência. Isso explicaria o pendor curitibano de fechar-se com os seus e de ser arredio ao forasteiro – um hábito supostamente cultivado de geração em geração devido ao frio.

Mas apenas isso não explica o Homo curitibensis. Afinal, embora tenhamos um inverno rigoroso para os padrões brasileiro, a cidade tem temperaturas agradáveis na maior parte do ano. A exceção – o frio intenso – poderia ser então causa de um comportamento que perpassa as estações?

Alguns dirão que Curitiba já foi mais fria e que não se fazem invernos tão longos como antigamente. Em tempos de aquecimento global, pode ser que sim. Mas o argumento da cidade que se aquece implica necessariamente a ideia de um novo curitibano, mais aberto – cidadão este que parece já estar andando por aí.

Pessoalmente, aposto que se Darwin pudesse explicar o curitibano não seria apenas pelo clima. Mas sim pelos espaços de convívio público. Ou pela ausência deles. Curitiba era provinciana até algumas décadas atrás. Não dispunha de muitos pontos de encontro: a Rua das Flores, o Passeio Público, o Teatro Guaíra, alguns cinemas e clubes. As longas distâncias entre os bairros daquela cidade de outrora, acentuadas por um sistema de transporte incipiente, dificultavam o encontro. As comunidades e as pessoas tendiam a ser, portanto, mais isoladas. E assim era o curitibano.

Mas hoje a cidade está mais cosmopolita. Há novas e variadas opções de lazer: shoppings, cafés, casas noturnas, museus, teatros etc. Inúmeros parques foram criados da década de 70 para cá. Todos os bairros estão interligados por um sistema viário e de transporte que, bem ou mal, funciona. O convívio entre as pessoas vem sendo facilitado.

Talvez esse contato acentuado entre os curitibanos venha a mudar nossa natureza introspectiva para sempre. Ao menos se o clima estiver minimamente agradável... Porque, nos dias mais gelados e chuvosos, temos todo o direito do mundo de se fechar no casulo.

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