Quando era criança, numa determinada época decidi torcer pelo extinto Pinheiros. Não sei muito ao certo por quê. Meus pais eram sócios e eu gostava de frequentar as piscinas do clube. Mas talvez tenha sido por causa do azul – a cor da camisa do escrete. Sempre gostei de azul. Muitos diriam que fiz uma má escolha. Nem me atentei ao fato de que o time era pequeno. Prenúncio de sofrimento. De poucos títulos e alegrias. E também de solidão: a torcida, afinal, era escassa. Torci em silêncio por algum tempo. Mas o time acabou. Fiquei órfão no futebol. Hoje, no máximo, simpatizo ou antipatizo com clubes.
Tantos anos depois, aquela escolha meio sem sentido – vejam só! – tem sentido (a gente, afinal, tem a estranha mania de preencher com algum significado aquilo que vive). Torcer por time pequeno é um exercício de esperança no improvável. De que coisas inesperadamente agradáveis podem acontecer. De que a lógica fria do dia a dia pode ser subvertida. De que, às vezes, algo mágico acontece. Sem isso, a vida não teria graça.
O sucesso dos islandeses é uma mostra de que, em determinadas circunstâncias, o fraco pode vencer na vida
Quem sabe não seja por esse motivo que um time pequeno seja sempre o segundo clube do coração de quase todo mundo. A maioria opta pelos grandes. Ninguém quer ser perdedor. E assim, torcendo pelos maiores, fica mais fácil. Mas pouca gente realmente é poderosa na vida. Por isso, excluído o time de que se gosta, quando se tem de optar entre o gigante e o nanico, em geral a escolha é pelo Davi diante do Golias.
É impossível não simpatizar, por exemplo, com os jogadores da seleção da Islândia comemorando a vitória sobre a favorita Inglaterra, na Eurocopa, junto com a sua torcida. O país de pouco mais de 300 mil habitantes era mais conhecido pelo frio, pelos vulcões de nome impronunciável e pela Björk. Agora entra no mapa do futebol.
O sucesso dos islandeses é uma mostra de que, em determinadas circunstâncias, o fraco pode vencer na vida. Eles investiram muito no futebol. Construíram campos cobertos e aquecidos. E estimularam os jovens a jogar bola. Alô, autoridades! Isso pode ser algo que o futebol tem a ensinar para que os políticos melhorem a vida dos pequenos da sociedade: incentivos e investimentos.
Mas eu não poderia terminar esta crônica sem me referir à mais fascinante história dos últimos tempos de times pequenos que vencem. O Leicester era um agregado de jogadores desacreditados. Pobre para os padrões britânicos. Com um técnico que rodou por grandes clubes, mas que nunca tinha conquistado nada muito relevante. Quase todos achavam que seria inevitável cair para a segunda divisão. Mas surpreendeu. E é o atual campeão inglês.
O segredo? Coração, alma e pizza. Primeiro, o estômago. O treinador – o italiano Claudio Ranieri –, a certa altura do campeonato, prometeu uma rodada de pizza se o time não tomasse gols. Funcionou. Na hora de pagar a promessa, a surpresa: os jogadores teriam de fazer a massa que iriam comer. Havia uma lição naquilo, porém. É preciso trabalhar, suar, para comer.
Agora, o espírito – a força que uniu o time sem crédito. E nada melhor que as palavras de motivação do próprio Ranieri: “Eu quero que vocês joguem pelos seus colegas. Nós somos um time pequeno. Então temos de lutar com todo o nosso coração, com toda a nossa alma. Eu não me importo com o nome do nosso adversário. Tudo o que eu quero é que vocês lutem. Se eles forem melhores que nós, tudo bem, parabéns! Mas eles terão de mostrar a nós que são melhores”. Amizade. Companheirismo. Luta. É isso. Um belo aprendizado.
Em tempo: eu cheguei a ver o Pinheiros ser campeão parananense. Às vezes o inesperado acontece. Assim é a vida.