Existe uma controversa teoria de que a Terra é um imenso ser vivo. A Hipótese Gaia, desenvolvida pelo britânico James Lovelock, é vista com descrédito por expressiva parcela da comunidade científica internacional. Mas ela tem o grande mérito de nos levar a raciocinar de uma forma diferenciada sobre a natureza. Se o planeta é um ser vivo, uma agressão ao meio ambiente, mesmo que seja o mais distante possível de nossa realidade, acaba por nos afetar, pois tudo está interligado. É mais ou menos como uma forte laringite: embora a infecção esteja localizada na garganta, ela nos deixa doentes por inteiro.
Me atrevo ainda a dizer que, se a Terra é um organismo vivo, os rios são como as artérias que irrigam nossas células. O planeta não vive sem água da mesma forma como nós não vivemos sem sangue. E qual o diagnóstico que um médico daria ao olhar a forma como cuidamos dos cursos dágua? Não é difícil especular: a Terra está enferma.
A Gazeta do Povo vem publicando desde o domingo passado uma série de reportagens que mostram como o principal rio do Paraná o Iguaçu está degradado. Não é só ele que sofre com a poluição. Mas as agressões ao Iguaçu têm um peso simbólico muito maior. Afinal, é o rio que abastece milhares de moradores da Grande Curitiba. Que move as turbinas das hidrelétricas responsáveis por parte significativa da energia que o Paraná consome. Que nos dá a maravilha das cataratas. Que, ironicamente, batiza o centro do poder paranaense: o Palácio Iguaçu.
Talvez devêssemos tentar enxergar o rio como uma pessoa. Se o Iguaçu fosse gente como a gente, com tantos benefícios que nos garante, seria um herói. Mas ele é maltratado. Cuspimos no prato em que comemos. Ou melhor, no rio que nos dá de beber e garante o banho nosso de cada dia.
Muitas vezes fazemos isso sem ter qualquer noção de nossas atitudes. Nos esquecemos de fazer a ligação do esgoto de nossas casas à rede de coleta. Jogamos papel de bala na rua. Mas qual curitibano pensa que, ao fazer isso tudo, pode estar sujando as cataratas? Sim, é isso mesmo. Qualquer sujeira que lancemos no chão de Curitiba, ao ser varrida pela chuva, cai nos bueiros. Que deságuam nos rios da cidade. Que deságuam no Iguaçu. Do mesmo modo que o esgoto lançado irregularmente nos córregos da cidade.
Se passarmos a entender que também somos responsáveis por nossos rios, talvez comecemos a cobrar dos governantes políticas públicas para que eles sejam efetivamente recuperados. Só assim, para ficar na formulação da Hipótese Gaia, vamos tirar a Terra da UTI.
Fernando Martins é jornalista.
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