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Esta é antiga, garante o Natureza Morta. Pré-internet, corre o sério risco de ser inédita. Um avião cai no deserto, em algum ponto da África. Três passageiros sobrevivem. Bob, Fritz e Manoel Joaquim. Passam-se os dias e eles agüentam o rojão, um socorrendo e amparando o outro, aquela coisa de caserna. Ou caverna.

Certa noite, junto à fogueira, Manoel Joaquim resolve dar uma caminhada ao luar. Depois de alguns metros, tropeça. "Ú, raios", esbraveja. Procura a insólita pedra no meio do caminho e encontra uma lâmpada. Corre para o acampamento.

– Olha o que eu achei!

Moral baixo, ninguém dá bola. Manoel Joaquim, feliz, passa a limpar a lâmpada. Esfrega, esfrega e, puf! Surge um gênio, é, o próprio, certamente discípulo do Geninho. O gênio se curva em reverência e declara estar pronto para os tradicionais três pedidos.

Fritz se antecipa:

– Quero estar em uma cervejaria de Munique, com muitos canecões de chope!

Zup! Num passe de mágica, ou de gênio, Fritz desaparece. Bob agarra-se à lâmpada e, rápido no gatilho, diz o que mais deseja:

– Quero estar em um cassino de Las Vegas, ganhando dinheiro a rodo, com um tonel de uísque e cercado de coelhinhas da Playboy.

Zup! Lá se vai o Bob.

Manoel Joaquim recolhe a lâmpada e um vagalhão (vagalhão? que vá...) de lembranças vem à sua mente. O medo durante a queda, as primeiras horas após o acidente, os longos e penosos dias andando pelo deserto, as dificuldades superadas pela fraternidade que se impunha, a divisão da última lata de sardinhas Coqueiro e da Antarctica, garrafa quentinha, sabor de forno.

E eis que tudo desmorona.

– Vai falar ou não? Desembucha! – insiste o gênio, já impaciente (tem mais clientes na agenda).

Manoel Joaquim, cabeça baixa, pensa mais um pouco na troca de experiências, digna de Camões.

E manda brasa:

– Ora, pois... Quero os meus amigos de volta!

Puz-puz (ou seja, zup-zup ao contrário). Eis que ressurgem no meio do deserto o Fritz, caneco na mão e totalmente parvo, e o Bob, mais estupefato ainda.

Moral da história, já que não se trata de uma das "fábulas fabulosas", de Millôr: amizade em excesso tem lá seus inconvenientes.

As palavras

As palavras são incríveis. Nada de novo nessa constatação. Existem, porém, palavras xaropes como xarope. Equinócio é uma delas. Já aurora boreal é solenemente tranqüilizadora. Uma das mais legais, porém, aprendi com a jornalista Sandra Gonçalves, aqui da Gazeta: panapaná. Panapaná, do tupi, é a migração de borboletas, formando nuvens. Toda essa engazopação para chegar a Mario Quintana que, em Comunhão, ensina:

"Os verdadeiros poetas não lêem outros poetas. Os verdadeiros poetas lêem os pequenos anúncios dos jornais."

A propósito: Quintana Café & Restaurante homenageia em Curitiba o poeta de Alegrete, porém universal. Beronha é freqüentador assíduo, lá no Batel:

– Como todos sabem, não bebo. Só que não consigo ficar um dia sem sorver o lirismo do poeta...

Aproveitando, um abraço para a Sonia Aksamitas.

Francisco Camargo é jornalista.

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