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Embora um notório vagabundo, não de carteirinha, posto que para sair da cama e procurar o Sindicato dos Desocupados e Coçadores (SDC) sempre sentiu preguiça, Beronha fez um esforço. Foi um esforço, mas colocou as barbas de molho. Culpa da pretendida flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho, ou CLT, como prefere, já que CLT é mais curto para dizer ou escrever.

Nosso anti-herói, que descarta qualquer possibilidade de ser um integrante do "lumpen proletariat", recorreu ao Natureza Morta. Para o oráculo de plantão da Vila Piroquinha, a questão é marota desde o início:

– Primeiro, flexibilização nunca existiu. Inventaram. Inventaram como tiraram da cartola o tal priorizar. Hoje, "priorizar a flexibilização" até não parece mais um disparate.

Sobre a milenar exploração do homem pelo homem – e a exploração por parte de quem passa a vida só olhando o trabalho alheio –, Natureza contou ao amigo o "achado" de Frederick Taylor, um "case de sucesso" que data de 1911. O dito cujo é autor de Os Princípios da Administração Científica, princípios que comprovam a assertiva de que, quanto menos você pegar no pesado, mais chance terá de ficar rico e famoso. Sem ter participado do Big Brother Brasil. Taylor ficou observando o jeito dos "cabôcos" trabalhando e o tempo que gastavam no batente.

Como bom fiscal de obra feita, formulou, então, a tese da racionalização do uso da mão-de-obra, escrava ou não. Picotando em etapas o processo de produção e separando o trabalho intelectual do trabalho manual, montou uma planilha para estabelecer o tempo gasto em cada tarefa, de modo que, a partir disso, cada uma delas fosse executada em prazos mais curtos. Tempo virava money. O BB americano não esqueceu, claro, de denunciar os "gastos desnecessários de energia" e apontar "comportamentos supérfluos" por parte do trabalhador, como bater papo. Dedo de prosa que fosse. O negócio era eliminar qualquer "desperdício". Talvez para ele ir ao banheiro seguidamente não fosse uma necessidade imperiosa por conta de um desarranjo intestinal, mas, simplesmente, tempo do patrão acintosamente jogado fora. Nascia, então, o taylorismo.

Henry Ford tratou de implantá-lo. Depois de turbinar o esquema, sempre ele, o esquema, Ford criou o fordismo, que previa, entre outras coisas, o aumento da capacidade de produção do operário em um mesmo período de trabalho (a tal da produtividade). Haja especialização e linha de montagem. Subjugado como os trabalhadores, o tempo tinha virado mercadoria em linha de produção. E estava a caminho a tal "otimização" de custos. Antes disso, porém, um antena da raça, Charles Chaplin, apresentaria a sua amarga visão das mudanças em "Tempos Modernos" (1936). Amarga porque Carlitos era humanista.

Após aula, nada professoral, Beronha foi bater ponto na bodega mais próxima:

– Viva o ócio criativo, ou melhor, viva o ócio etílico criativo!

Mentalmente, Natureza endossou a opinião.

– Já que quem trabalha não tem tempo para ganhar dinheiro, e insistem em flexibilizar e priorizar, comecemos por flexibilizar a amolação diária, priorizando a preservação da paciência alheia. Tenho dito.

E tratou de sair ao encalço de Beronha, já que também parece mas não é lúmpen.

camargo@gazetadopovo.com.br

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