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Em busca de resposta para algo que o persegue e intriga até hoje, uma lasca das lembranças da juventude, Beronha recorreu à primeira edição (1975) do dicionário Aurélio. E encontrou casas de todos os tipos. Casa bancária, casa geminada, casa do leme, casa de purgar, casa de penhor (essa todo mundo deve ter conhecido), casa de tavolagem (jogo), casa militar (não se trata do codinome da distinta patroa), casa civil (não se trata da "outra", do mesmo distinto cavalheiro titular da casa militar), casa dos entas (casa que principia por um número que termine em enta, dos quarenta aos noventa), casa matriz, casa da moeda, casa da misericórdia, casa de alça, casa de aviamento, casa decimal, casa de detenção, casa de farinha, casa de correção, casa de jogador de espada (casa desarrumada, desarranjada, segundo o Aurélio), casa de obras (oficina tipográfica, em contraposição à casa de jornal), casa de orates (casa sem ordem, onde ninguém se entende), casa de pasto (restaurante com preços populares), casa dos milagres, casa funerária, casa noturna, casa do sem jeito (cidadão em situação difícil), ô de casa (palavras de alguém que bate à porta ou bate palmas no portão), casa de tolerância (epa!), casa popular e casa de cômodos.

Mas, afinal, o que procurava o nosso herói, ou melhor, anti-herói?

Procurava casa de família, segundo Natureza Morta.

Quando criança, no hoje bairro Rebouças, Beronha brincava e perambulava pelos campos do 5 de Maio, do Tebé e, mui evidentemente, pela Baixada da Buenos Aires do mais mui ainda glorioso Atlético. Numa esquina da Westphalen, perto do Senai, bem na esquina, existia uma casa de material que, de um dia para outro, apareceu "pichada" pelo próprio dono, com letras imensas, caprichadas ao máximo. Ocupando quase todo o espaço superior da fachada, estava lá, em enormes letras azuis, para todo mundo ver e tomar ciência: casa de família.

Com o seu Himalaia de paciência, Natureza tratou de desfazer o enigma, explicando que, certamente, era o contraponto de casa de tolerância, na época identificada por penetrante foco vermelho para atrair – é aqui mesmo – boêmios e outros pastores da noite.

E foi além, descrevendo possíveis cenas do inferno em que se metera o sujeito ao alugar uma casa que, antes, tinha sido um "rendez-vous" dos mais frequentados:

– Toda a noite e durante a madrugada, para desespero dele, da mulher e dos filhos, sempre aparecia gente, viajantes ou caminhoneiros, batendo à porta para fazer uma farra com as raparigas.

Para poder alugar o imóvel, o dono tinha removido o foco vermelho, mas a turma ia pelo reflexo – ou piloto automático.

Pelo que consta, e até onde foi possível apurar e deduzir, o aviso não deu certo. Vencida, a família tratou de mudar de endereço. Hoje, naquela esquina, repousa um belo edifício. A lâmpada vermelha voltou, mas é outra, para alertar pedestres sobre saída de veículos.

A Bíblia está certa quando diz que a casa do Pai tem muitas moradas.

De fato, e sem esquecer Casa Grande & Senzala, de Gilberto Freire nem a Casa Verde, do nosso Noel Nascimento. E, é claro, As Moradas, primeiro filme do amigo Sylvio Back.

Pra encerrar, a genial observação de Drummond de Andrade:

Lutar com palavras

é a luta mais vã.

Entanto lutamos

mal rompe a manhã.

camargo@gazetadopovo.com.br

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