Quando Rosemar Casagrande Faust, a Branca, avisou Deus e o mundo que estava de mudança para capital, um mundaréu de aflitos lhe soprou no ouvido: "O povo de Curitiba, cê sabe, né..." Deus, sábio, calou-se em sua catedral. E Branca nem deu pelota. Apurada com tanta roupa para dobrar, repetiu foi seu mantra "gente é tudo igual em tudo que é canto." Simbora.
Mal chegou ao baita prédio em que se instalou, na Praça do Japão, já puxou conversa hum, no elevador, aquele lugar em que, dizem as más línguas, curitibanos da gema não distribuem simpatia nem se a bordo estiver "a sobrenatural" Isabeli Fontana, mendigando um reles "oi, tudo bem?"
Pois alguém vai ver um forasteiro não só disse "bom dia" à recém-chegada como a ajudou a descer as malas no 15.º andar, espaço onde aninhou o marido Gláucio, os filhos Ricardo, 20, e Rodrigo, 12. Casa arrumada, só lhe faltava um plá com a vizinhança o que tratou de aviar em 13 de junho, às vésperas do flagelo suíno.
Passou na floricultura, comprou 40 vasos de flores e escreveu no computador uma mensagem para aqueles com os quais agora divide um dos metros quadrados mais caros de CWB. Com esse gesto, sem saber, exorcizou o texto "Curitiba, a fria", escrito nos idos de 60 pelo pernambucano Fernando Pessoa Ferreira, depois de sacudir o pó das chinelas e tomar o rumo Norte, para nunca mais voltar.
Diz a carta:
"Caros, somos os novos moradores do apartamento 1501. Queremos nos apresentar e manifestar nossa satisfação em fazer parte deste condomínio. Embora a vida moderna nos permita pouco tempo para convivência e novas amizades, seremos vizinhos e dividiremos espaços comuns. Esperamos ter uma ótima relação com todos.Contem conosco!"
Pois seu Fernando em pessoa precisava saber dessa. O chão quase tremeu nas ribanceiras do Batel. Teve quem interfonasse, comovido. Quem enleasse pão de casa e bombons. O síndico de olhos vermelhos. Outros, no elevador, manhã bem cedo, nocautearam a timidez, nossa marca de nascença: "Você é a Branca do 1501? Bem-vinda a nossa cidade."
Só faltou a orquestra do Max Steiner, no hall, tocando o tema de E o vento levou... Imagino a cena: a Sete de Setembro pararia. O povo se abraçaria na frente do Colégio Santa Terezinha tipo "O Beijo de Lamourette", nos idos da Revolução Francesa. Seríamos matéria do Fantástico e admirados por algo mais do que a canaleta do Expresso. Dia 13 de junho se converteria em nosso Brancas Day. Que tal?
Rosemar, a Branca, é natural da minúscula Marmeleiro, "a passarela do Sudoeste", de 13 mil habitantes. Fez carreira no Banco do Brasil, o que a obrigou a circular pelo interior, ano em Chopinzinho, ano em Pato Branco. "Em tudo que é canto", repetiu o mesmo ritual. Flores e cartas ao chegar. Ao partir, lenços brancos do adeus.
Em Cascavel, o condomínio foi tão caloroso que a cidade devia ser rebatizada de Pintassilgo. Em Campo Mourão, emoção sem par. Como tem deixado muita gente amiga pelos 6 mil quilômetros de rodovias do estado, faz horas extras em época de Natal. Chega a noite e dá-lhe mandar bolachas caseiras para os seus.
Segundo consta, Branca só não chama a população à praça para dançar cirandas por ossos do ofício: ela é superintendente regional do Banco do Brasil e tem sob sua custódia 500 funcionários, divididos em 37 agências da região metropolitana e outras mais. Seu expediente é cumprido dia em Mandirituba, dia em Tijucas do Sul. Acha ótimo.
E se por acaso os vizinhos estiverem meio reservados, mal não faz. Debruça-se na janela do apê e conversa com o irmão, que mora no prédio ao lado. Ali cria sua Trans-Marmeleiro um lugar onde Curitiba é quente demais.
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