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A cada quatro anos, vamos às urnas, queiramos ou não, tenhamos escolhido um candidato ou não, e elegemos homens e mulheres (raras) para nos representarem no comando da cidade, do estado e do país. Acontece, então, um fenômeno dos mais tristes. Eleitas, aquelas pessoas se transformam em estranhas para nós: estamos longe delas e elas de nós. Seria exagero dizer que, vistos daqui do nosso posto de eleitores, eles, os eleitos, passam a agir segundo uma lógica só deles, segundo regras de eleitos-que-querem-ser-reeleitos e não mais as regras do mundo real, do mundo onde habita a maioria? Quantas vezes temos a impressão de que eles estão do outro lado da trincheira e não lutando ao nosso lado?

Acho que esse distanciamento entre eles e nós é pior no Legislativo e no Judiciário (este último, que não elegemos). No Executivo, uma única pessoa canaliza toda a expectativa da população e se torna alvo direto de críticas e cobranças. Prefeitos, governadores e presidente dão a cara para bater o tempo todo, queiram eles ou não. São cobrados por questões objetivas, do dia a dia do cidadão. O que não acontece com vereadores, deputados e senadores que vivem em nuvens de bordas indefinidas, em multidões chamadas "plenários" em que é fácil se esconder. Dá para acompanhar o voto dos parlamentares, sim. Mas esse esforço precisaria ser feito por todos os eleitores, sistematicamente, para que eles se sentissem cobrados e vigiados. Não é o que acontece e eles tiram vantagem disso.

O Judiciário, por sua vez, é um clube fechado de senhores e senhoras convencidos de que são especiais. O contato deles com o povo se dá em espaços pré-definidos em que são os mestres, em que decidem o destino do cidadão que se apresenta diante deles. Cobrar modéstia desses senhores, quem há de?

Tudo isso para dizer que a nossa realidade política tem jeito de pesadelo. Somos obrigados a dar nosso voto para pessoas que, empossadas, fazem o que querem, conforme seus interesses pessoais. É como se fôssemos obrigados a participar de uma roleta-russa. A arma é apontada para nossa cabeça por nós mesmos. Nos daremos mal ou nos safaremos conforme a vontade deles, conforme as balas que colocam na agulha.

Nem me passa pela cabeça defender outro regime que não seja a democracia. Sou contra qualquer outra alternativa. A democracia é um regime sofisticado que reflete o estado mental da sociedade, seus valores e suas idiossincrasias. É um mecanismo que tem de ser calibrado o tempo todo. As eleições fazem parte desse ajuste. Infelizmente não é suficiente por causa de uma dessas idiossincrasias a que me referia acima. A sociedade brasileira não tem muito apreço pela ideia de igualdade. Isso se reflete no sujeito eleito ou concursado que se acha digno de vantagens e dono de uma superioridade intelectual que o afasta do populacho. É uma democracia com jeitão de oligarquia.

Há uma desconexão entre as centenas de membros do Legislativo brasileiro, em todas as instâncias, e nós. Não sei se é pior agora do que foi em anos passados ou em décadas passadas. O que sei é que vereadores, deputados e senadores não reconhecem que a sociedade evoluiu em alguns aspectos e que é preciso calibrar a relação que eles mantêm conosco. Em tempos de dificuldades econômicas, como agora, os ânimos se acirram. É hora de descerem do pedestal.

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