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Marleth Silva

Fala alguma coisa, Cleonice!

Um problema no computador me fez telefonar três vezes para a assistência do fabricante. Todos os técnicos que atendiam soavam estrangeiros, apesar do português correto. Perguntei: onde você está? “Em Montevidéu, Uruguai” -- me respondeu a moça. Mais tarde, precisei falar com outro serviço, desta vez da Microsoft. Mate minha curiosidade, em que cidade você está? “Em São Paulo, hehehe” – digitou o técnico, de nome Emerson.

Qual é a graça? Ele mesmo, que fica ali sentadinho, provavelmente em um daqueles prédios modernosos das marginais, deve achar curioso esses diálogos entre pessoas que estão distantes e que, para efeito prático, poderiam estar em qualquer lugar.

“Essa ligação vai custar uma fortuna e você não diz nada, Cleonice!”

Ali, daquele lugar-nenhum onde trabalha, o rapaz foi capaz de entrar na minha máquina e alterar arquivos. Com a minha autorização, é claro. Enquanto acompanhava no monitor o que ele fazia, o cursor correndo de um lado para outro entre as pastinhas amarelas, eu inventariava mentalmente o conteúdo do computador que, se ele quisesse, poderia acessar. Fotos de família, registros de contas, declaração de imposto de renda, as crônicas. Uma carta que vou escrevendo aos poucos para a prima. Talvez ali houvesse algo embaraçoso. A intimidade, quando exposta, é sempre embaraçosa.

E pensar que há pouco tempo até receber um telefonema de um lugar distante provocava excitação. Que se esperava até às dez da noite para fazer interurbanos porque o valor da tarifa diminuía. Que se alugava linhas telefônicas... Uma dessas linhas alugadas me rendeu boas risadas. Eu morava em São Paulo e, quando chegava em casa, checava os recados deixados na secretária eletrônica. Sempre havia mensagens para outras pessoas, que eu supunha terem usado o número antes de mim. Como a mulher com sotaque do Norte do Brasil, que não entendeu que falava com uma máquina e se desesperou com o silêncio do outro lado da linha: “Cleonice, fala alguma coisa, minha filha! Essa ligação vai custar uma fortuna e você não diz nada, Cleonice!”

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Mais uma evidência de que as coisas estão acontecendo em uma velocidade acelerada como nunca antes. Dados da Organização Mundial de Saúde mostram que a perspectiva de vida cresceu muito em um espaço de tempo curto. O brasileirinho que nasceu em 2015 pode esperar viver 75 anos. Parece pouco? É 15 anos a mais que a perspectiva que eu tinha ao nascer, há quase 50 anos. Deve ser por isso que, de uma hora para outra, descubro que conheço vários nonagenários.

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44% dos brasileiros não lê livros (Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil). Diante dessa tristeza, até fotografei a cena: ao chegar a uma escola pública na Cidade Industrial de Curitiba, dei com um grupinho de crianças acompanhando, com gritos de entusiasmo, a leitura que a professora fazia de um livro. Fui apresentada à moça. Ela também estava tão animada com a leitura, que resumiu tudo para mim, rapidinho. Fiquei com inveja daquele escritor, que conseguiu deixar tanta gente feliz.

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A beleza das palavras, 5: Yuanfen. Mandarim. A força desconhecida que reúne duas pessoas, amigos ou amantes.

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