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Outro dia vi um anúncio que usa a letra de uma canção dos anos 70, mais precisamente de 1971, Ca­­sa no Campo, de Zé Rodrix e Tavi­to. É aquela que ficou famosa na voz de Elis Regina: "Eu quero uma casa no campo/onde eu possa com­­por muitos rocks rurais/e tenha somente a certeza/dos amigos do peito e nada mais". A letra tem um tom hippie, característico da época. Combinava com a nostalgia que devia estar na cabeça dos brasileiros, que viam a população mi­­grar em massa do campo e das pe­­quenas cidades para as capitais. Êxodo rural e movimento hippie talvez expliquem a vontade dos autores de terem uma casa no cam­­po com "carneiros e cabras pastando solenes no meu jardim".

O que me chamou a atenção na letra, ao lê-la agora, em 2010, quando não se fala mais em êxodo rural, muita gente nem lembra o que era um hippie e Elis Regina está morta há inacreditáveis 28 anos, é o verso que diz "eu quero um filho de cuca legal". Um filho de cuca legal! Meu Deus! É o que mais quero: que meus filhos tenham uma cuca legal. Ou traduzindo para uma linguagem contemporânea, que meus filhos tenham mentes saudáveis, equilibradas diante dos excessos de estímulos e das falsas necessidades que caracterizam nosso mundo. Que meus filhos tenham condições de ser felizes, enxergando e desfrutando o que há de bom em torno deles. Que não sejam paralisados pelas suas dificuldades emocionais ou intelectuais.

É verdade, nenhuma cabeça fica legal 100% do tempo. Nem ao longo de um dia conseguimos fi­­car equilibrados, o que é normal. Se sentimentos perturbadores fazem parte da nossa natureza, pior seria fingir que não existem. Mas e quando a mente pende perigosamente para um lado só? Quando não há mescla entre esperança e desesperança, entre anseio e resignação, entre insegurança e autoconhecimento? Que medo do desequilíbrio que pode fazer com que as crianças não se tornem adultos de "cuca legal"... É o medo que tenho pelos meus filhos e pelos filhos dos meus amigos e pelas crianças que cruzam meu caminho.

A maioria será equilibrada o suficiente para não se afundar no próprio ego e nas dores do mundo. E para não se angustiar achando que precisa de coisas que custam dinheiro e das quais, na verdade, não precisam. Aliás, a casa no campo de que fala a música era de pau a pique e sapê e o que estava lá, além dos amigos e das crianças de cuca legal, eram "discos e livros e nada mais". Está de bom tamanho.

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