A garotada que sempre viveu na cidade pequena ficou encantada com a informação de que no novo edifício, o primeiro com mais de três andares, havia um elevador. Os apartamentos são apenas casas sem quintal e com uma vista maior, mas o elevador... O elevador é uma espécie de bonde elétrico, de automóvel que qualquer um pode pilotar ainda que num trajeto limitado. Quem tinha um amigo ou parente morando no edifício aparecia para visitar. Quem não tinha um conhecido usava de malandragem. Aqueles dois meninos que passavam por ali de manhã, no caminho para a escola, entravam fingindo normalidade e embarcavam no elevador, rumo ao último andar. No primeiro dia, estar no elevador foi suficiente. No segundo, apagaram a luz. No terceiro, havia adultos lá dentro e os dois tiveram um acesso de riso ao chegar no terceiro andar. No quarto, foram seguidos pelo porteiro e colocados para fora. Antes, tiveram tempo de apertar todos os botões.
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“Aqui todo mundo se conhece” – é algo que sempre se ouve na cidade pequena
Era da menina o caderno mais organizado da classe. Ela nunca levava bronca dos professores porque não se permitia deslizes de comportamento. Talvez não fosse a mais inteligente, mas sabia estudar. “Que letra linda!” – diziam as amigas. Quando em dúvida sobre datas de provas ou temas de trabalhos, todos consultavam a menina estudiosa, que tinha tudo anotado. Imaginava-se que seria professora. Veio então a adolescência, o primeiro namorado e, com ele, uma gravidez. A menina estudiosa casou, feliz. Cuidar do filho e, junto com o marido, jovem como ela, ganhar o sustento consumiu toda a sua energia. A moça estudiosa não estudou mais e se contentou com ocupações modestas. Vieram mais filhos. Passou a vender roupas de porta em porta e assim manteve a família depois que as dores nas costas do marido o prenderam em casa.
Hoje é pobre e carrega frustração pelos sonhos enterrados, mas acredita na assistência de Deus e tem seus momentos de felicidade nos almoços e lanches que trazem o filho e os netos para perto dela.
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“Aqui todo mundo se conhece” – é algo que sempre se ouve na cidade pequena. Mas algumas pessoas são mais discretas que outras. Elas preservam suas vidas dos olhares dos outros, protegem os seus da curiosidade. Elas têm seus segredos. Na cidade pequena mora uma moça que tem alguma deficiência. Qual é a deficiência, só os pais dela sabem. Ou talvez nem eles nem os médicos que já consultaram. Ela tem uma limitação intelectual. Ela é diferente. Com a intenção de lhe dar uma vida normal e feliz, os pais evitam falar sobre o assunto. Na escola, as outras meninas notam que ela é mais alta, tem mais idade. Não deveria estar em outra classe, mais adiantada? Mas ela brinca com as colegas como se não fosse uma moça de seios fartos, de corpo de mulher. Ela é bonita. Mais um motivo para os pais cercarem-na de cuidados. Na cidade pequena a moça diferente é mantida dentro de casa.
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