| Foto: Felipe Lima

O aparelho de telefone está ali, sobre uma mesinha, conectado à rede que vem da rua pela tomada. Em outros tempos foi acompanhado por outra máquina, a secretária eletrônica, hoje uma velha senhora aposentada. O próprio telefone caminha para a aposentadoria. Quase não toca mais, substituído que está sendo pelo celular. Quando toca, dá susto. Uma voz artificial diz um “olá” animado demais e começa a despejar uma mensagem. É uma gravação: lá vem um candidato pedindo meu voto ou empresas propondo despesas que não quero fazer. Outras vezes são moças e rapazes que começam a conversa esclarecendo que “para sua segurança, esta chamada está sendo gravada”.

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Ninguém escreve ao coronel para dar a ele uma boa notícia, lamentou García Márquez. Pois ninguém telefona para a minha casa para dar qualquer notícia.

Os adolescentes fogem do telefone fixo, ficam desconfortáveis com o trambolhão na mão e negam-se a atendê-lo

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Em outros tempos, este telefone que não toca provocaria sensação de abandono. Hoje o silêncio dele fala de mudança dos tempos, de obsolescência tecnológica. Nada a ver com desamor, com falta de consideração, com isolamento.

Nem o celular toca tanto quanto tocava pouco tempo atrás. Agora só bipa para avisar que mensagens chegaram. Crescidos nesta realidade, os adolescentes fogem do telefone fixo, ficam desconfortáveis com o trambolhão na mão e negam-se a atendê-lo. Claro que não vai ser para eles, “telefone fixo é coisa de velho”. Aquelas adolescentes penduradas no aparelho em conversas intermináveis com as amigas cresceram e agora teclam suas conversas, assim como seus filhos e netos. A imagem só sobreviveu em filmes dos anos 80 que ninguém mais vê. Falar, meus amigos, ficou tão démodé...

Voltando mais atrás ainda, em filmes estrangeiros dos anos 50 e 60, os personagens atendiam o telefone e saíam com o aparelho na mão, esticando um fio interminável, à procura de um canto discreto para falar livremente. Ou o serviçal desconectava o aparelho da tomada, levava até a sala onde se encontrava o patrão e ali voltava a conectá-lo. Vi outro dia uma cena assim em Europa 51, com Ingrid Bergman, do Rosselini. Que mundo chique! Enquanto isso, aqui no Brasil nós entrávamos na fila para comprar uma linha fixa, que custava uma fortuna.

O cidadão que, neste ano da graça de 2015, passa um dia útil em casa descobre que algo mudou. Quando o telefone fixo toca, boas chances há de que seja um engano. Uma voz vem lá de longe perguntando pelo Alfredo, insistindo para falar com a Margarida, perguntando se o Valfrido já chegou da usina. O tom da voz, o sotaque, o nome solicitado revelam imediatamente que alguém discou o número errado. Mas o sujeito não aceita a resposta e insiste. Liga de novo, inconformado com a informação de que esta não é a casa do Valfrido. Quando isso me acontece, encurto logo a conversa. “A usina explodiu!”, “Margarida fugiu!”, “Alfredo, ah, este Alfredo, não sai do banheiro...” Sei que é maldade, mas é que esse pessoal que usa telefone fixo é muito teimoso.

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