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Vou logo deixando claro que o raciocínio não é meu. Li em algum lugar que adolescentes vivem em um presente eterno. Que para eles não há futuro. Por isso tudo tem de ser resolvido agora e esperar por algo que lhes parece uma insensatez. Aplico o mesmo raciocínio às crianças. Só as datas comemorativas, que se repetem, dão a elas a perspectiva de futuro. Crianças esperam pelo Natal, pela Páscoa, pelo aniversário e pelas férias porque, depois de terem vivido a repetição dessas datas, percebem que elas sempre chegarão. Fora disso, o futuro não existe. Diga para uma criança que algo que ela espera virá em uma semana ou um mês e prepare-se para o "bico" que vai aparecer no rostinho dessa criatura imediatista.

E por que não veem futuro aqueles que têm mais tempo para viver? Por algo que o Veríssimo, no texto publicado neste mesmo espaço na última quinta-feira, definiu assim: "a gente vive para frente, mas compreende para trás." Se a pessoinha viveu 10 anos, dos quais se lembra de uns cinco, como vai entender de tempo? Aliás, quem entende?

Para um adolescente de 16, um adulto de 30 é um velho. Enquanto isso, alguém de 50 anos tem a impressão de que 30 anos passam em um piscar de olho. O tempo é percebido de formas diferentes dependendo de onde se está na linha cronológica da vida. Se você está no começo da linha, lá pelos 12 ou 17 anos, tem boas chances de ter muita coisa pela frente, mas vive com a impressão de que só existe o aqui e o agora. Se está lá pela metade, digamos que aos 45 anos, 50 anos, você até se anima acreditando que tem muita coisa no horizonte, ao mesmo tempo em que se descobre cheio de memórias, de experiência acumulada.

Lembro disso quando leio sobre a evasão escolar. É no ensino médio que o Brasil perde a chance de ter um índice de escolaridade capaz de nos garantir um futuro justo e promissor. Menos obedientes à tutela dos pais que os obrigavam a não faltar às aulas, muitos adolescentes vão se afastando da escola até abandoná-la de vez. Abandonam a escola e a chance de entrar em um mercado de trabalho que exige ensino médio para tudo — ainda que o salário inicial do mercado seja o mesmo mínimo que se paga para quem abandonou a escola no primário.

Se adolescente naturalmente tem dificuldade para visualizar futuro, imagine o que acontece com aqueles que estão em escolas deficientes, dentro de um sistema que não sinaliza para um rumo profissional, e que em casa não têm exemplos de ascensão social proporcionada pela educação? Neste perfil, se encaixa a maioria dos adolescentes brasileiros. Que a evasão não seja ainda pior é sinal de que eles têm mais juízo do que muito adulto por aí.

Marleth Silva é jornalista.

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